O clima no Brasil é de pessimismo generalizado. Apesar da política antiinflacionária aplicada pelo ministro Bresser Pereira, a inflação repicou para patamares bem acima dos esperados; a renegociação da dívida externa, reconhecida como um dos maiores constrangimentos da economia, não dá sinais de chegar a um bom termo; os assalariados sentem pesada a perda de poder aquisitivo, que será agravada pelo reajuste do recolhimento do imposto de renda na fonte; os indicadores de nível de atividade mostram que o desaquecimento tende a se aprofundar; e os desequilíbrios orçamentários públicos não são efetivamente controlados.
Uma análise fria da situação econômica do Brasil não mostra, de fato, resultados animadores, principalmente em relação às perspectivas de crescimento a longo prazo, como apontado neste mesmo espaço nas duas últimas semanas. A prosseguir na atual tendência, a economia brasileira deverá sofrer forte desaceleração em sua taxa histórica de crescimento.
Contudo, os indicadores de curto prazo não podem ser extrapolados simplisticamente. A inflação está atingindo um patamar alto em relação às expectativas iniciais; mas, por outro lado, a demanda está desaquecida, o que estava previsto no plano de estabilização do ministro Bresser, e ajudará a evitar um desgarramento do patamar de 8% ao mês.
O restante do ano será certamente marcado por uma contração; mas isso não significa dizer que seja impossível o reinício de uma expansão moderada, a partir do início de 1988, caso a inflação se estabilize efetivamente. Para que isso ocorra, no entanto, é preciso atentar para as pressões de custos dentro do setor produtivo.
É comum ouvir a alegação de que, face à grande queda nos salários reais ocorrida desde o último trimestre de 1986 (certamente superior a 30%), abriu-se a possibilidade de ganhos na margem de lucro dos empresários. Desta forma, prossegue o raciocínio, não há como justificar os aumentos de preços reivindicados por vários setores industriais, em alguns casos superiores a 40%; tratar-se-iam apenas de pressões objetivando uma certa margem de segurança no caso de um novo congelamento de preços.
Em realidade, e o governo deve atentar cuidadosamente para este fato, vários setores sofrem consideráveis pressões de custos. Importantes insumos industriais, alguns ofertados pelo setor público, tiveram fortes elevações de preços durante o período de congelamento. Aço, energia elétrica e combustível são alguns exemplos. Além disso, os componentes importados sofreram majorações a partir da política cambial adotada. E houve ainda os efeitos da redução do volume de vendas em 1987, gerando impactos altistas nos custos fixos das empresas.
Assim, nota-se que o impacto da política econômica adotada nos últimos meses foi muito desigual para diferentes setores da economia. Favoreceu o setor produtivo estatal e os exportadores líquidos. Os demais acham-se fortemente pressionados por elevações de custos, podendo, portanto, dar início a uma nova espiral inflacionária.
Este é o maior desafio para estabilizar a inflação, ou seja, reajustar preços relativos dentro da margem de cerca de 3%, determinada pela diferença entre a variação da URP (5%) e a meta de 8%. Boa sorte à Seap.
MARCOS CINTRA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE, 41, Doutor pela Universidade de Harvard (EUA), diretor de Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas e consultor econômico desta Folha.