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Marcos Cintra - Folha de S.Paulo

A continuidade dos desequilíbrios

A economia brasileira chega ao final do ano de forma bastante diferente da que entrou em 1987. Doze meses antes, o setor produtivo operava a plena capacidade, o país perdia reservas aceleradamente, a absorção interna crescia em função do aumento dos salários reais ocorrido durante o Plano Cruzado, e a inflação mostrava uma alarmante tendência explosiva.


Hoje, há capacidade ociosa, os rendimentos do trabalho acham-se comprimidos, as reservas se acumulam com a recuperação dos saldos comerciais, e a inflação mostra uma tendência de estabilização nos próximos meses. Em outras palavras, a economia brasileira passou por um doloroso, porém necessário, ajuste às mazelas cometidas durante o primeiro congelamento de preços.


Isso não significa, contudo, que foram recriadas as condições para que o país volte a crescer de forma equilibrada durante 1988. Pelo contrário, o que se nota é que ainda não foram tomadas as medidas necessárias para isso. Apesar de o Brasil ter uma economia com grande dinamismo, sempre pronta para iniciar um processo de expansão, faltam pré-condições para que isso ocorra. Ademais, os mesmos fatores responsáveis pelos desequilíbrios verificados no passado continuam presentes, fazendo com que fases bruscas de expansão e contração possam voltar a ocorrer nos próximos meses.


O fator limitante mais significativo para uma fase de expansão confirmada da economia brasileira acha-se na redução dos investimentos. Os dados da tabela anexa mostram a queda na formação de capital, que certamente deve ter se agravado durante 1987. O virtual desaparecimento das poupanças externas e públicas sancionará a baixa propensão a investir por parte do empresariado.


Mais grave ainda é que não há no horizonte qualquer perspectiva de saneamento das contas do setor público, nem de incentivo à entrada de capitais externos. São as consequências da recusa do governo em atacar de frente a questão dos gastos públicos, bem como da moratória de fevereiro último que, embora parcialmente superada, ainda acarretará sérias consequências para o Brasil nos próximos anos.


Quanto aos aspectos conjunturais relativos à inflação, não se deve esperar que a estabilização momentânea signifique a ausência de fatores inflacionários graves. Apenas o forte desaquecimento da economia justifica sua permanência no atual patamar. O potencial inflacionário dos reajustes salariais que vêm ocorrendo nos últimos meses e que deverão prosseguir em 1988 poderá iniciar nova escalada de preços. Da mesma forma, choques de oferta e o estouro do déficit público serão constantes ameaças à estabilidade dos índices inflacionários.


Como se vê, 1988 não promete ser um bom ano.


 

MARCOS CINTRA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE, 41, é doutor pela Universidade de Harvard (EUA), diretor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas e consultor econômico desta Folha.

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