Segundo dados da Comissão de Valores Mobiliários, as emissões de ações no ano de 1987 caíram em mais de 70% em relação a 1986. Apenas 14 empresas abriram seu capital no ano passado, e em valores constantes de dezembro último, as emissões de novas ações atingiram apenas Cz$ 80,38 bilhões no ano anterior. Trata-se do pior resultado desde 1979, exceto durante os anos de crescimento econômico negativo em 1981 e 1983.
Sem dúvida, o processo de abertura de capital das empresas está intimamente vinculado à performance da economia. Fases de crescimento acelerado favorecem o desenvolvimento dos mercados de capitais, abrindo caminho para a colocação de novas ações no mercado. A retração da economia brasileira e os problemas verificados nas Bolsas de todo o mundo no ano passado explicam, em parte, a enorme queda na emissão de ações. Há, contudo, outras causas, mais profundas, que contribuem para a anemia das Bolsas brasileiras, enfraquecendo, assim, uma clara tendência de pulverização do capital, que se observa nas principais economias do mundo capitalista.
No Brasil, os mercados de capitais ainda não cumprem importantes funções como meios de obtenção de liquidez para os aplicadores, ou fontes de recursos para capitalização das empresas. Há pouca credibilidade, a partir da inoperância da legislação reguladora dessas operações, tornando inviável a conversão de rentista em acionista, de crédito em capital de risco, de empresas familiares em companhias abertas.
Cabe lembrar ainda que, em parte, a desconfiança do aplicador nas Bolsas de Valores decorre da presença maciça das empresas de capital misto. Tais empresas, operando como monopólios estatais, conseguem, não raro, obter alta lucratividade, transferindo a seus acionistas privados lucros que, em realidade, deveriam pertencer à coletividade. Por outro lado, também não raramente, essas empresas são forçadas a grandes sacrifícios financeiros, seja por serem obrigadas a transferir recursos ao Tesouro ou às demais empresas do Estado, seja por terem seus preços fixados em função de critérios outros que a busca "da eficiência e da rentabilidade.
Dessa forma, as oscilações nos preços das ações dessas empresas tendem a refletir as incertezas administrativas e gerenciais que caracterizam a gestão pública, transferindo uma sensação de risco e insegurança excessivos para todos os investidores.
O mercado de capitais precisa de liberdade para se desenvolver. Ao mesmo tempo, não pode prescindir de regras de conduta que garantam a lisura das operações. Para coibir abusos, o Estado deve ser duro e inflexível em seu papel fiscalizador, mas deve-se manter ausente dos legítimos mecanismos de formação de preços. Finalmente, monopólios estatais não deveriam ter acionistas privados e, portanto, não deveriam estar nas bolsas.
MARCOS CINTRA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE, 41, é doutor pela Universidade de Harvard (EUA), diretor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas e consultor econômico desta Folha.