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Marcos Cintra - Folha de S.Paulo

Além da liquidez

Com a intensificação das pressões recessionistas na economia, a oposição ao Plano Collor se acentua. As alegações de que o programa de estabilização irá gerar profundos desequilíbrios econômicos aparecem com mais frequência. E aumentam as pressões sobre as autoridades econômicas para flexibilizar as medidas de controle da liquidez.


O que não deve ser esquecido por aqueles que criticam as injustiças que teriam sido impostas é que caso o Plano Collor não tivesse sido decretado, as perdas teriam sido muito mais graves. Na semana imediatamente anterior à posse do novo governo, houve um começo de corrida bancária. Provavelmente, as instituições financeiras não teriam resistido, e as perdas dos investidores poderiam ter sido totais.


O Plano Collor acena com a possibilidade de evitar a total desvalorização do estoque de ativos financeiros. Cerca de 20% já se transformaram em moeda. O que irá ser do restante do estoque dependerá da evolução da economia pós-Plano Collor.


Existe a possibilidade de que a economia se recomponha nos meses seguintes. Se isso ocorrer, a demanda por liquidez irá aumentar, quando então o governo liberará os recursos retidos, evitando perdas patrimoniais. Caso, contudo, a estratégia antiinflacionária não logre sucesso, as perdas serão exatamente aquelas que ocorreriam sem o Plano Collor.


O custo dessa operação de salvamento é a profunda recessão que se abaterá sobre a economia brasileira. Evidentemente se espera que ela seja a menor e a mais breve possível. Há que atentar, contudo, que qualquer tentativa de atenuar seus efeitos terá como imediata contrapartida o aumento das probabilidades de um insucesso.


O acompanhamento da conjuntura e o uso de instrumentos para calibrar corretamente a dosagem de liquidez que a economia necessitará para evitar uma depressão, e também a reinflação, passam a ter crucial importância. Não há fórmulas que resolvam esse problema a priori. O governo optou por dar início ao plano com um estoque monetário relativamente baixo. Trata-se de uma estratégia correta, pois certamente é preferível ir injetando novos recursos do que retirá-los, eventualmente de excessos. A assimetria é evidente.


A consistência do Plano Collor a médio e longo prazos dependerá do seu impacto fiscal. O governo precisará convencer os agentes econômicos acerca do equilíbrio intertemporal de suas contas. Afinal, foi essa inconsistência que colocou as autoridades em xeque, forçando o setor público a inundar o mercado com papéis que jamais poderiam ser resgatados.


A parte monetária da estabilização já está em curso. Cabe esperar que o governo resista às pressões para atenuar em demasia sua política.


Resta agora verificar o que ocorrerá no lado fiscal. O governo terá de gerar superávits suficientemente grandes para lastrear as liberações dos recursos congelados, menos a quantidade de moeda que a economia desejar reter. Trata-se de um volume brutal de recursos. Cabe às autoridades mostrar de onde eles virão, ou então aceitar o ceticismo com que muitos analisam a devolução dos recursos sequestrados.

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