Itália, quarta maior economia do mundo capitalista. Produto Interno Bruto de mais de US$ 800 bilhões. Superada apenas pelos Estados Unidos, Japão e Alemanha Ocidental. Na década de 80, ultrapassou a Inglaterra e, recentemente, se encontra cabeça a cabeça com a França.
Dez anos antes, um país cheio de charme e encantamento. Mas marcado pela ineficiência, malandragem, violência, terrorismo, greves. Inflação de dois dígitos. Música, massas, boa vida. Pouco trabalho. Economia informal, subterrânea.
Hoje, o exemplo de uma nação que encontrou o rumo da modernidade, sem renegar suas raízes. Um país que encontrou e soube explorar o capitalismo.
Recente pesquisa mostrou que mais da metade dos italianos gosta de habitar em seu país. Esta preferência vem se acentuando com o passar dos anos. Na década de 90, a Itália deverá se consolidar como a nação que obteve a síntese do capitalismo com o humanismo.
Três características da moderna economia italiana chamam imediatamente a atenção dos brasileiros: a importância da pequena e média empresa; a grande participação estatal no setor produtivo e os desequilíbrios orçamentários do setor público.
Desde a década de 30, mais de 50 governos se revezaram na condução da economia italiana. Não obstante o caos administrativo e burocrático, fortaleceu-se a pequena empresa, nutrida pela elevada taxa de poupança e pela atávica mentalidade burguesa-comercial de sua população. Trata-se, porém, de um modelo de convivência fértil com os grandes conglomerados privados, como a Fiat, Ferruzzi, Pirelli, Montedison, Benetton, Olivetti e muitos outros. Não é a relação autofágica que caracteriza o relacionamento entre os grandes e pequenos, como ocorre em vários setores da economia brasileira.
Por outro lado, o gigantismo do Instituto de Reconstrução Nacional (IRI), criado por Mussolini em 1933 para ser um tipo de BNDES, embora notável por suas realizações, não deve servir de exemplo para o Brasil. É hoje a maior holding estatal do mundo. Fatura quase US$ 50 bilhões por ano nos mais diversos setores produtivos. Da aeronáutica à massa de tomate. No passado, sempre com enormes prejuízos, até que o gênio de um homem, o professor Romano Prodi, a transformasse em um grupo mais rentável e relativamente eficiente.
O IRI chegou a ter sob seu controle mais de mil empresas. Apesar da franca adesão da Itália à livre iniciativa, apenas uma das poucas dezenas foram privatizadas. A grande pergunta é o que será da IRI após o término da gestão do professor Prodi.
O passado intervencionista da economia italiana também é marcado por um setor público fortemente deficitário, cerca de 10% do PIB ao ano. Além disso, a dívida pública é maior do que a produção anual total da economia do país. No entanto, a inflação tem ficado em cerca de 5% ao ano.
Qual o milagre? A alta taxa de poupança, uma das mais próximas da japonesa dentre as economias ocidentais. O governo precisa gastar o que o setor privado prefere poupar. Sem isso, a economia poderia sofrer uma crônica tendência recessiva.
Mais uma vez, trata-se de uma característica que o Brasil não deve, nem pode, imitar.
A Itália desponta como uma das mais dinâmicas economias em todo o mundo. Progressista, audaciosa, criativa. Mas cheia de contradições aos olhos brasileiros. Descobriu as virtudes do capitalismo moderno, apesar de seu setor estatal gigantesco.
MARCOS CINTRA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE, 43, é doutor pela Universidade de Harvard, diretor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas e consultor de economia da Folha.