O Brasil necessita de uma legislação antitruste sólida. É de conhecimento geral que as práticas comerciais em vários setores brasileiros, se fossem avaliadas à luz das normas dos EUA, levariam muitos executivos a cumprir penas de prisão. No entanto, é incompreensível que as ações contra supostas práticas oligopolísticas sejam tomadas de forma casuística, guiadas pelas emoções momentâneas de membros do primeiro escalão do governo.
Antes de se manifestar contra os aumentos de preços, o governo deveria concentrar esforços na elaboração e implementação de uma legislação apropriada para preservar a competição. Além disso, as autoridades econômicas não deveriam se envolver nessas questões, que cabem à área da Justiça. Enquanto o Ministério da Economia critica de forma insensata os aumentos de preços, os setores do governo responsáveis por montar uma estrutura de proteção contra abusos do poder econômico estão desprestigiados, desarticulados e inoperantes. Nesse contexto, o projeto de liberalização da economia corre o sério risco de fracassar, de um lado devido aos abusos dos setores mais concentrados e, de outro, devido a intervenções desastrosas como a polêmica relacionada aos preços de automóveis e medicamentos.
A legislação antitruste brasileira precisa ser aprimorada e aplicada de maneira consistente, sem sofrer influência das pressões que surgem a cada anúncio de índices inflacionários. O que está em jogo aqui é muito mais do que apenas estatísticas sobre aumentos de preços. Trata-se da consolidação de uma estrutura produtiva eficiente, competitiva e livre de abusos, tanto por parte dos vendedores quanto dos compradores. Deve haver proteção ao cidadão contra abusos cometidos pelo próprio governo, que em muitas de suas decisões não demonstra o mesmo respeito que exige das empresas em relação aos cidadãos.
Este é um exemplo claro de que a inflação não será controlada no Brasil enquanto reformas estruturais profundas não forem implementadas. O "terrorismo econômico" praticado pela equipe econômica não levará a lugar nenhum, apenas a tensões, à falta de regras claras e a surtos de inflação reprimida.
MARCOS CINTRA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE, 44 anos, é doutor pela Universidade de Harvard (EUA), diretor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas e consultor de economia da Folha.