A estabilização irá exigir do governo atos de coragem já descritos em duas ocasiões nesta coluna: a imediata decretação da independência do Banco Central e a ousadia de resistir ao intervencionismo, praticando uma política econômica voltada essencialmente para o fortalecimento do mercado.
Outro ato de coragem que se espera do governo é admitir a necessidade da indexação. Nenhuma economia consegue sobreviver com taxas de inflação como as brasileiras. Inevitavelmente, e à revelia de qualquer regulamentação governamental, a economia se reindexará sempre que a inflação assim exigir. Impedir este fato resultará em paralisação de atividades, evasão de capital, e retrocesso tecnológico irrecuperável.
O Plano Collor 2 não fugirá deste destino. As pressões pela reindexação vão se tornar cada vez mais fortes, apesar da teimosia de economistas que insistem em identificar causa e efeito na relação entre indexação e inflação. Em realidade, são, uma da outra, tanto causa quanto efeito. Assim é preciso combatê-las simultaneamente, jamais sequencialmente, como pretende o governo.
Enquanto houver inflação, a indexação é uma âncora sem a qual não há como balizar as decisões econômicas. E a única forma de evitar que os preços nominais se tornem destituídos de qualquer conteúdo de informação econômica, e de evitar a dolarização, e o risco de lançamento da economia no espaço hiperinflacionário.
A inflação corrente ainda é baixa, possivelmente na casa de 5% mensais. Não há, porém, qualquer expectativa de que se mantenha este patamar nos meses seguintes. Com a inexistência de indexadores — e o ridículo de se proibir a divulgação e a elaboração de índices de inflação como o IPC — a tendência natural poderá ser o uso da Taxa Referencial de Juros para substituir a antiga BTN. No caso altamente provável de uma aceleração nos aumentos de preços esta solução poderá ser trágica. A TR embutirá expectativas inflacionárias crescentes, e poderá detonar uma explosão. Se se tentar controlar a TR, ainda pior.
Há necessidade de um indexador confiável. O governo deve começar a montá-lo o mais rapidamente possível.
MARCOS CINTRA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE. 44, é doutor pela Universidade de Harvard (EUA), professor da Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas, consultor de economia da Folha e presidente regional do PDS.