Em economia com altas taxas de inflação, como no Brasil, não há como evitar a indexação. Sem ela, os preços perdem conteúdo informacional e as distorções em termos de redistribuição de renda são intensas e indesejáveis do ponto de vista social. Nesse sentido, há que se aceitar a indexação como inevitável.
Contudo, sabe-se também que a indexação rapidamente se transforma de efeito em causa da inflação. A. automaticidade dos reajustes de preços implica indesejável rigidez para baixo e realimenta a elevação permanente dos preços, aumentando o custo social das políticas de estabilização.
O professor Stephen Kanitz apresenta uma interessante, e ao mesmo tempo perturbadora, constatação acerca da indexação no Brasil. Se estiver havendo aumento de inflação, os índices de preços são superestimados. Quando ele cai, os indicadores da inflação são subestimados. Assim, a cada congelamento de preços, há uma ilusória sensação de que a inflação cessou; e quando do descongelamento, ela se acelera fortemente, já que a inflação calculada é superior a real.
Segundo Kanitz, a causa dessa distorção se encontra no fato de os índices de inflação captarem os preços a prazo, e não à vista como seria correto. No caso de um aumento da inflação, mantendo-se o prazo de pagamento constante, o custo financeiro é acrescentado ao aumento do preço à vista, do que resulta uma distorção da taxa de inflação apurada.
Essa constatação é interessante na medida em que justifica a tendência de aceleração crônica da inflação. O indexador em realidade contém um fator de aceleração dos aumentos de preço, o que transforma a inflação inercial em inflação acelerada, como vem apontando Bresser Pereira.
Cumpre acrescentar ainda que a solução seria computarem-se os índices de inflação a partir do valor presente dos preços fixados a prazo. Mas, mesmo assim, o uso de índices de custo de vida como indexadores ainda poderia estar superestimando a inflação real, pois ainda se estaria ignorando importantes efeitos microeconômicos no comportamento do consumidor, tais como o fato de ele pesquisar preços e comprar pelo mais baixo —e não pelo preço médio, como apurado pelos institutos de pesquisa— e de haver um efeito-substituição, que é sistematicamente ignorado no cômputo dos índices de inflação. Como está sendo feita, a indexação é necessária, mas ao mesmo tempo extremamente perversa no controle inflacionário.
Marcos Cintra Cavalcanti de Albuquerque, doutor em Economia pela Universidade de Harvard (EUA).