Já alertamos, nesta coluna, sobre a inconveniência momentânea de corrigir o preço dos combustíveis. Além de forte impacto nos custos industriais, os combustíveis são emblemáticos na simbologia inflacionária brasileira. O que se temia está acontecendo, com a agravante da péssima administração governamental do processo. A inflação medida pela Fipe, que vinha mostrando tendência declinante embicou para cima, atingindo 0,54% na 1ª quadrissemana de abril, podendo ir além de 1% no mês. Uma das grandes vitórias do Plano Real foi a de modificar a dinâmica inflacionária, ao extirpar a indexação generalizada. Aumentos de preços, que no passado eram rapidamente transferidos a outros setores, passaram a ser vistos mais como alteração nos preços relativos. Assim, é preciso preservar esse novo comportamento econômico, impedindo surtos de epidemia indexatria. Contudo, o uso do cachimbo faz a boca torta. A indexação é tentadora para os que se consideram perdedores no processo de estabilização -como os assalariados. Com a aproximação de maio, quando se corrige o salário mínimo, a tentação pode se tornar irresistível, principalmente se a elevação dos preços mostra aceleração. Para agravar o quadro, os preços dos cereais no mercado internacional estão explodindo (o trigo aumentou quase 50% neste ano). Nos EUA se espera alta de 2,2% dos alimentos em 1996 e no Brasil a cesta básica já aumentou 1,17% este mês. Sem falar na alta dos preços internacionais do petróleo, que já atingiram os patamares de 1991, de US$ 23 por barril.
Marcos Cintra Cavalcanti de Albuquerque, doutor em Economia pela Universidade de Harvard (EUA).