O governo se prepara para implementar a reforma tributária e, para isso, convoca as lideranças políticas e empresariais a apoiarem seu projeto, baseado em um estudo realizado na Universidade de São Paulo, com o patrocínio da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo.
No entanto, o projeto do governo inova pouco e mantém a mesma estrutura atual, com algumas modificações nas competências tributárias entre os vários níveis de governo. Ele unifica os atuais impostos sobre circulação, como o IPI, o ICMS e o ISS, privando estados e municípios de suas principais fontes de recursos próprios. Para compensar, cria um imposto sobre vendas a varejo e entrega-lhes impostos seletivos sobre alguns produtos e serviços importantes.
O impacto dessas mudanças é significativo, acentuando a centralização tributária e tornando estados e municípios ainda mais dependentes das transferências da União, que administraria o novo imposto sobre o valor agregado, o IVA. As repercussões políticas dessa centralização de recursos são previsíveis e reforçam a tendência hegemônica da Presidência da República na vida política e econômica do país, revertendo a orientação que vinha sendo seguida desde o fim dos governos militares.
No que diz respeito ao impacto nos setores da economia, é evidente o esforço para desonerar a indústria de suas obrigações fiscais. O novo imposto a ser administrado por estados e municípios onera apenas o comércio varejista, liberando o setor industrial dos impostos de circulação. Além disso, a fragilidade financeira que recairá sobre estados e municípios é preocupante, uma vez que ficam com a competência de explorar impostos de varejo que são inviáveis em nossa sociedade.
Os custos de arrecadação desse tributo serão enormes, devido à prática generalizada das mais variadas formas de evasão fiscal. Estabelecer aparatos de fiscalização e cobrança desses impostos será um pesadelo para os governos estaduais e municipais que já enfrentam crescentes dificuldades orçamentárias com a política de descentralização de encargos e centralização de recursos que, de forma contraditória, parece ter sido adotada no país.
Uma análise prospectiva do futuro perfil de arrecadação tributária no Brasil sob esse novo modelo revela inconsistências significativas. Supondo que a carga tributária permaneça constante, a unificação do ICMS, do IPI e do ISS deverá implicar em uma alíquota de 21%. O aumento da alíquota média atual do ICMS, que é cerca de 15%, estimulará a sonegação, uma vez que o prêmio para o sonegador aumenta com a alíquota nominal do imposto. Se a sonegação já é alta com uma alíquota média de 15%, certamente aumentará consideravelmente se as alíquotas subirem para 22%. A resposta provável será um aumento no aparato burocrático de fiscalização, com todos os efeitos indesejados associados a isso.
Do ponto de vista de estados e municípios, o cenário é ainda mais grave, pois a arrecadação do novo imposto sobre o varejo é imprevisível, considerando as incertezas e as circunstâncias culturais desfavoráveis em que ele será arrecadado. Além disso, os impostos seletivos, de responsabilidade dos estados, terão sua arrecadação dificultada, uma vez que, por serem tributos incidentes sobre algumas poucas fontes tributárias de elevada capacidade arrecadatória, dificilmente poderão ser administrados de forma descentralizada e difusa pelos estados. É paradoxal que o modelo tributário do governo centralize a base tributária de estados e municípios (ICMS e ISS), que deveria ser descentralizada, e descentralize o que deveria ser centralizado na União (impostos seletivos). Esse sistema carece de justificativa lógica e de viabilidade operacional.
Vale ressaltar que o projeto da Universidade de São Paulo, que inspirou a proposta do governo, possui maior consistência técnica. No entanto, a quantificação do novo perfil de arrecadação revela resultados altamente preocupantes. Conforme publicado na "Informações Fipe", as simulações mostram que, para manter a arrecadação global constante, seria necessário triplicar a receita do Imposto de Renda, de R$ 32 bilhões para R$ 90 bilhões anuais.
Como esse milagre será realizado ainda precisa ser demonstrado pelos autores do estudo. Esse aumento explosivo do Imposto de Renda tornou-se necessário mesmo com alíquotas do Imposto de Vendas a Varejo de 15%, um valor que excede em muito o limite razoável. Infelizmente, a discussão sobre a reforma tributária no Brasil ainda se baseia em teses intelectuais pouco operacionais, como as que o governo e a Fiesp defendem. Enquanto isso, o sucesso arrecadatório da CPMF e do Simples, que indicam a viabilidade prática do modelo de Imposto Único, continua sendo ignorado pelo governo. É pena.