A experiência da CPMF vem sendo observada em todo o mundo como um bem sucedido exemplo de aplicação de um imposto sobre transações financeiras em larga escala. Agora que o Brasil busca caminhos para reformar seu modelo tributário – dos mais perversos e ineficientes do mundo – seria trágico se esse experimento fosse ignorado como querem alguns. Condicionados por idéias e (pre)conceitos estabelecidos, muitos economistas reafirmam que tributos sobre valor agregado são bons, ao passo que impostos cumulativos (ou em cascata) são ruins. Mas é surpreendente a afirmação, repetida por muitos, que a CPMF é um péssimo imposto já que, por incidir em cascata, é inflacionário, prejudicial à produção, nocivo à competitividade das exportações brasileiras e causadora de sérias distorções alocativas. Qualquer imposto, cumulativo ou não, repercutirá no preço final do produto e, logo, “prejudica” a exportação. Contudo, o que nem sempre é notado e destacado é que um imposto em cascata com alíquota baixa pode ser preferível a um imposto sobre valor agregado com alíquota alta. O grande apelo da CPMF é ser insonegável, admitir alíquota nominal baixa para certo nível de arrecadação, enquanto os impostos declaratórios tradicionais, tipo ICMS, altamente sonegáveis, exigem alíquotas elevadas para arrecadar um mesmo valor. Portanto, a CPMF, contrariando seus críticos, prejudica menos a produção do que os impostos convencionais. A exemplo do antigo Imposto de Vendas e Consignações, do Simples, da Cofins, do ISS e do Imposto de Renda Pessoa Jurídica sobre o lucro presumido, entre outros tributos tradicionais, a CPMF é um tipo de “turnover tax”. A diferença substancial, e que torna a CPMF superior, é que esta usa a transação bancária como instrumento não declaratório de arrecadação – uma forma eletrônica, barata e eficiente de recolher tributos. Quanto às exportações brasileiras, o que lhes tira competitividade é o emaranhado de impostos e contribuições aqui cobrados, embora muitos deles incidentes sobre o valor adicionado em cada etapa da produção. Apenas parte dos impostos que gravam a cadeia produtiva das exportações é desonerada. Os demais tributos são exportados pelo País. Nesse aspecto, a CPMF é semelhante aos demais impostos. Pois não é o tipo de imposto que tira competitividade das exportações, mas sua cobrança embutida nos preços dos produtos exportados. Cabe notar que a desoneração das exportações é inteiramente possível, mediante a avaliação dos impostos dentro de seu preço final através das matrizes de insumo-produto, elaboradas em institutos de pesquisas econômicas no Brasil. Aliás, a legislação internacional sobre comércio exterior no âmbito da Organização Mundial do Comércio – OMC, admite a devolução dos tributos indiretos cobrados no processo produtivo, amplamente praticada por vários países. Alguns, como a França, enviam ao comprador estrangeiro os impostos pelo correio, denominado “détax”. Teme-se que a CPMF aumente os custos das aplicações nos mercados financeiro e de capitais, reduzindo sua rentabilidade de curto prazo; e que sua incidência sobre as operações em bolsa afugente os fundos estrangeiros, podendo deslocar o centro de liquidez dos papéis brasileiros para o exterior. Este risco existe. A propósito, meu projeto do Imposto Único prevê que tais operações sejam tributadas em seu rendimento real. O principal não seria taxado e a tributação somente ocorreria na transferência dos ganhos reais para a conta movimento do aplicador, tornando-se disponível para outros usos. Como deputado e membro da Comissão de Reforma Tributária, venho defendendo a instituição do Imposto sobre Movimentação Financeira – IMF. Apresentei projeto de emenda propondo sua criação para substituir, paulatinamente, vários tributos, como IR, IPI, PIS/COFINS, INSS e outras contribuições sobre a folha de salários. Por adesão de Estados e Municípios, o ICMS, o IPVA, o ITBI, o IPTU e o ISS poderão, também, ser eliminados. Dentre as propostas de reforma tributária no Congresso, o IMF é contribuição positiva. Seria ótimo que o País mostrasse coragem e o introduzisse com alíquotas elevadas o suficiente para compensar a eliminação de tributos ineficientes como o ISS e o ICMS, por exemplo. Ou que pudesse desonerar a folha de pagamentos com a imediata extinção das contribuições, que, além de altamente burocratizantes e dispendiosas, causam a mais perversa das distorções alocativas – o desestímulo à contratação de mão-de-obra e a ultrajante e perniciosa explosão do desemprego.
Marcos Cintra - Correio Braziliense