A discussão sobre o novo salário mínimo beira o absurdo. A polêmica sobre o tema foi antecipada em mais de seis meses, trazendo para outubro uma questão que normalmente vinha sendo tratada pelo governo apenas em março ou abril de cada ano. A estranheza tem início quando se nota que a fixação do salário mínimo brasileiro nada tem a ver com o que a lei define como sendo o salário mínimo. Diz a Constituição que o piso de rendimentos dos trabalhadores deve ser fixado de forma a permitir a manutenção de uma família com um mínimo de dignidade. Hoje não se discute esta questão. O que baliza a fixação do salário mínimo é a situação das contas do INSS, que formalmente nada tem a ver com os salários que as empresas pagam aos seus trabalhadores. Esdrúxulas alianças políticas se formaram em torno do aumento do mínimo, e unem velhos adversários como o PT e a parte do PFL comandado pelo senador Antônio Carlos Magalhães, ambos os grupos disputando, de forma quase caricatural, a paternidade da defesa de um salário mais digno para o trabalhador brasileiro.
Houve a proposta de elevar o mínimo para o patamar equivalente a US$ 100 mensais, ou R$ 180. Infelizmente, a discussão já inicia natimorta, na medida em que a recente crise na Argentina fez a cotação do dólar ultrapassar a R$ 1,90, o que, por sua vez, torna inviável a concretização da emblemática cifra de US$ 100 na fixação do salário mínimo brasileiro.
Tudo seria apenas mais um episódio curioso da política brasileira se não acabasse gerando decisões equivocadas. Parece que, infelizmente, a solução encontrada é altamente prejudicial à economia brasileira, ainda que resolva, no curtíssimo prazo, a demanda política por uma boa solução demagógica. A opção encontrada indica que os recursos virão do aumento de tributação dos fundos de previdência privada. Trata-se de uma solução míope, pois a tributação desses fundos de previdência privada irá desestimular a poupança. Além disso, a tributação adicional dos fundos poderá reduzir a captação de recursos que têm sido importante fonte de financiamento para o governo cobrir o déficit público. É preciso que a sociedade brasileira se aperceba de que a solução encontrada irá significar um saque contra os rendimentos futuros dos atuais assalariados, e que isso significa apenas jogar o problema para a frente.
Publicado no Jornal A Voz do Povo: 25/11/2000