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Marcos Cintra - Diário do Comércio

Cenário dispensa FMI

Há um ano, o mundo não apostaria um tostão furado no futuro da economia brasileira. Nos últimos meses de 2002, o dólar explodiu, as bolsas desabaram, os juros galgaram as alturas, a dívida pública chegou a 63% do PIB, a inflação voltou aos dois dígitos, o risco-Brasil nos mercados financeiros internacionais atingiu mais de 2.400 pontos, atrás apenas da Argentina e da Nigéria. Ninguém investia, os aplicadores estrangeiros repatriaram seus recursos livres, todos vendiam, ninguém comprava. Alguns culpavam a política econômica de FHC e os efeitos do populismo de seu primeiro mandato. Outros atribuíam ao FMI os males advindos da política de austeridade que fora exigida após as duas operações de salvamento que aquele organismo coordenou a favor do Brasil em 1998 e 2002. Outros ainda imputavam a crise ao discurso do PT, às suas propostas pré-eleitorais de governo, e apostavam que seu comportamento oposicionista irresponsável e oportunista seria prova segura do tipo de governo que estaria sendo instalado. O PT assumiu em 2003 e rezou pela cartilha do FMI. Apertou a política monetária e aprofundou a contenção fiscal. A inflação medida pelo IPCA caiu de 2,25% em janeiro para 0,34% em agosto; o dólar desabou de R$ 3,50 para R$ 2,90; o risco Brasil. deslizou para cerca de 600 pontos. O desemprego bateu 13% da PEA e a taxa de crescimento estimada pelo mercado mergulhou para menos de 1%. Tudo exatamente como esperado pela receita do PT/FMI.


Hoje a crise é outra. E a discussão também. Apenas dez meses após a transição de governo o debate que se trava é se o acordo com o FMI deve, ou não, ser renovado. Há diferenças significativas entre o momento atual e as crises do passado. Pela primeira vez as discussões sobre o FMI não ocorrem em cenário emergencial de instabilidade monetária ou de crise nas contas externas. Pelo contrário, houve notável melhoria na evolução do balanço de pagamentos. A queda nos investimentos diretos ainda não foi recuperada, embora as perspectivas de retomada do crescimento econômico para os próximos anos indiquem provável reversão. A necessidade de uma política de austeridade fiscal e de realismo cambial foi amplamente assimilada por todos. Já há uma percepção generalizada acerca da inviabilidade de uma política de expansão da atividade econômica fora de um ambiente de estabilidade monetária e de equilíbrio nas contas externas. Nesse sentido, cabe indagar qual a razão para prorrogar o acordo com o FMI. A renovação do acordo com o Fundo não é necessária. Alguns dos critérios de desempenho implicam indevida interferência em assuntos de política econômica interna, que compete exclusivamente ao governo decidir, como a retirada da cumulatividade do PIS e da Cofins, a venda de bancos públicos, a busca de alternativas de arrecadação para a CPMF e a criação de fundos de pensão complementar para servidores públicos. Recolocar o país na trilha do crescimento é imperativo para o atual governo. Não há mais razões que o impeçam de agir ativamente nesta direção. A renovação do acordo com o FMI não parece ser necessária ao prosseguimento da implementação do ajuste econômico, mas poderia implicar algum desnecessário constrangimento na retomada dos investimentos públicos. Melhor seria prosseguirmos sozinhos.

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