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Marcos Cintra - Folha de S.Paulo

Opções erradas


Em 2005, o Brasil acumula mais uma taxa de crescimento medíocre de seu PIB. No início do ano, havia expectativa de expansão entre 3,5% e 4%, taxa insuficiente sequer para absorver os novos contingentes de trabalhadores que anualmente buscam emprego. Atualmente, a expectativa do Ipea é que a economia cresça apenas 2,3% em 2005 e 3,4% em 2006. O governo teve um início elogiável ao dissipar a crise gerada pela expectativa negativa criada em 2002 com a perspectiva de eleição de Lula. A rigidez e a determinação da política econômica a partir de 2003 restituíram a confiança dos agentes econômicos, ainda que a um custo social elevado. Em seguida, as exportações e o crédito consignado animaram a atividade produtiva, recuperando a economia em 2004. Naquele momento, o presidente Lula poderia ter investido com afinco no crescimento de longo prazo, fazendo deslanchar as reformas fundamentais como a administrativa, a político-partidária, a previdenciária e a tributária. Além disso, teria sido oportuna a adoção de um novo programa fiscal visando rever o volume e a qualidade dos gastos públicos, tornando possível a redução dos juros, apontados pelo presidente como principal motivo da desaceleração da economia. A oportunidade foi desperdiçada. No momento, o crescimento do PIB vem perdendo fôlego e ameaça estagnar. O mais dramático é que o Brasil não aproveita uma conjuntura internacional fortemente positiva e que tem feito a quase totalidade dos países em desenvolvimento mostrarem desempenhos econômicos notáveis. O governo aponta sua artilharia contra o Banco Central. Afirma que houve excesso na condução da política monetária. Em realidade, a culpa deve ser buscada na política fiscal, sob responsabilidade direta do presidente da República. Nos últimos anos, o governo praticou uma política fiscal acomodatícia privilegiando o assistencialismo. Cabe destacar que o crescimento do gasto público contribui para pressionar os juros. O que torna a situação mais grave é que os gastos públicos crescem por conta do aumento das despesas de custeio em detrimento dos investimentos. Segundo o economista Amir Khair, os investimentos da União caíram de 0,86% do PIB no período de 1995/2002 para 0,52% no biênio 2002/2004. Já as despesas com custeio cresceram de 14,55% para 15,41% do PIB. A tabela acima revela que as despesas correntes da União crescem num ritmo que torna necessária a elevação da receita tributária. Ao mesmo tempo, os superávits primários atingem patamares elevados, próximos de 5% do PIB. Esse cenário, associado à desaceleração do PIB, fez ecoar mais forte o discurso de membros do governo a favor da redução do saldo primário e da elevação dos gastos do governo federal. Surge assim uma situação expansionista explosiva que combina pressão por mais gastos públicos com redução imediata dos juros. Mas, para reduzir juros, a saída é cortar as despesas públicas. Aumentar despesas via transferências de renda, como faz Lula, pode ser um expediente indicado para tentar ganhar a eleição, mas não contribui para a geração de um clima propício à expansão da atividade econômica. Há estudos do Ipea mostrando que a transferência de renda aos mais pobres pouco muda a perversa distribuição de renda brasileira. E, se houve melhora na distribuição de renda, isso se deve mais a perdas de renda dos mais ricos do que a melhorias no padrão de vida dos mais pobres. Trata-se de situação Pareto-inferior. É possível concluir que seria melhor investir em ações que dessem origem a sistemas produtivos autônomos nos bolsões de pobreza, fazendo os “excluídos” participarem diretamente do processo de geração de riqueza, em vez de se tornarem agentes passivos de uma política populista, paternalista e assistencialista. A economia brasileira acha-se enredada em uma armadilha que compromete dramaticamente seu crescimento. As reformas estruturais dificilmente avançarão em 2007. A única saída seria um novo norte na condução da política econômica, baseado na redução das despesas públicas como forma de cortar os juros. Mas isso já é querer demais de um governo que busca desesperadamente sua reeleição.

 

MARCOS CINTRA, doutor em economia pela Universidade Harvard (EUA), professor titular e vice-presidente da Fundação Getulio Vargas.

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