Corrupção e enriquecimento ilícito tornaram-se fatos corriqueiros e tolerados pelos brasileiros. Em tempos recentes ocorreram, por exemplo, o mensalão e a roubalheira na Petrobrás. Fatos graves como esses derrubariam governos e fariam revoluções em países ciosos de seus direitos. Aqui tudo vira “folclore”, como disse Lula certa ocasião. A culminação dessa injustificável tolerância foi plenamente completada com a reeleição de Dilma Rousseff, cujo grupo político chafurdou na lama toda a nação.
O mensalão e o caso da Petrobrás não são apenas uma ação de quadrilheiros roubando em benefício próprio. Sempre houve ladrões, aqui e no resto do mundo. É da natureza humana. Mas no Brasil é mais do que isso. Criou-se uma organização criminosa, uma estrutura político-social organizada, incrustada no poder, agindo de maneira sistêmica e orgânica, comprando votos e consciências e violentando o funcionamento das instituições.
Tudo isso afasta da política os homens bem intencionados, criando uma reserva de mercado e um vasto campo de atuação para os setores podres da sociedade que fazem da política e da atividade pública uma profissão, tendo como única meta atingir seus objetivos pessoais. A política deixa de ser uma contribuição que os cidadãos devem sentir-se moralmente obrigados a oferecerem aos demais concidadãos, e passa a ser um meio de vida. Homens públicos abandonam suas atividades profissionais, e passam a depender da política para garantirem sua sobrevivência. Pessoas nessas circunstâncias tornam-se capazes de tudo e de qualquer coisa para sobreviverem. Ao invés de profissionalizar a administração pública, como fazem os países avançados, profissionaliza-se a política, que passa a substituir o burocrata de carreira (no bom sentido) na gestão do Estado.
Quando as elites se locupletam, o povo sente-se legitimado para fazer o mesmo. Os meios de comunicação glorificam desvios de conduta éticos e morais. Novelas principalmente, escoradas no princípio inquestionável da liberdade de opinião e estimuladas pela desbragada luta por audiência, desafiam a consciência dos cidadãos que ainda possuem algumas referências para discernir o certo do errado. A apologia da malandragem, da ganância, da luxúria e de outros vícios corrói instituições e valores tradicionais como a família e a convivência pacífica e civilizada entre pessoas.
A acintosa ostentação dos ricos é ofensiva e aguça a violência. A indústria do medo prospera de forma assombrosa. A propriedade privada passou a ser um direito relativo com a inatividade do governo frente às invasões de terras e de imóveis urbanos. A depredação de bens não é mais punida, desde que seja protegida sob o manto dos “movimentos sociais”. O poder público se omite e tenta acomodar a situação. O Brasil beira a afronta institucional.
E enquanto tudo isso ocorre, a chamada “sociedade civil organizada” apenas esboça reação com inúteis mobilizações midiáticas que em geral posicionam-se contra, corretamente, muitos aspectos da nossa triste realidade, mas mostram-se incapazes de serem a favor de algo capaz de avançar na busca de soluções efetivas. Mobilizam, sem propor. Deixam a impressão de terem apenas objetivos políticos eleitorais.
Nesse triste e desalentador cenário, creio que só uma revolução salva o Brasil. Uma revolução de ideias, e disposição para mudar.
Marcos Cintra é doutor em Economia pela Universidade Harvard (EUA) e professor titular de Economia na FGV (Fundação Getulio Vargas). Foi deputado federal (1999-2003) e autor do projeto do Imposto único.
Publicado na edição de julho da Revista Siderurgia Brasil.
Publicado no Jornal A Gazeta Regional (Caçapava - SP): 17/07/2023
Publicado no Portal Pró Trabalhador: 22/07/2023
Publicado na Revista AMais: Agosto de 2015