A tecnologia digital coloca a sociedade global em um patamar de evolução que há 20 ou 30 anos podia ser considerado um cenário de ficção. Nesse ambiente, onde há automóveis projetados para voar e que dispensam motorista e robôs realizam cirurgias em seres humanos com enorme precisão, as pessoas usufruem de maior comodidade em suas atividades rotineira, vivem mais e otimizam seu tempo com entretenimento. As empresas podem desenvolver novos modelos de negócios, customizar produtos e serem mais eficientes e lucrativas. No âmbito público ela torna possível um nível de governança menos burocrático, que agiliza processos e permite uma gestão mais transparente.
O ambiente digital é uma realidade que faz com que inovações ocorram de modo cada vez mais rápido. Os fluxos de bits and bytes transportando dados, que antes impactava fundamentalmente sobre elementos intangíveis, hoje também afeta elementos tangíveis de modo extraordinário. Aspectos concretos, palpáveis, da atividade de produção são cada vez mais determinados pela era digital. Como bem definiu o economista e professor da Fundação Getulio Vargas, Fernando Rezende, trata-se de um mundo novo, marcado pela virtualização das transações, caracterizado pela substituição das máquinas e outros ativos físicos pela capacidade intelectual; por amplas redes unindo fornecedores, clientes e até competidores; e que torna irrelevante a localização das plantas empresariais.
A informática e o ambiente digital na qual a atividade produtiva está contida segue impactando todos os meandros da sociedade, com exceção da ciência tributária.
Os sistemas de impostos e contribuições de um modo geral destoam em um mundo que evolui com base na inteligência artificial e na troca de informações fundamentada em impulsos elétricos.
Muitos acadêmicos, tributaristas, economistas e outros agentes que lidam com a área fiscal, no Brasil e no resto do mundo, seguem tratando as estruturas tributárias como uma máquina de escrever ou de calcular mais rápidas. A tecnologia digital não penetrou nesse meio, isto é, não influenciou conceitos e bases dos sistemas tributários. A principal forma de cobrança dos fiscos se dá em moldes convencionais. Ou seja, continua sendo a movimentação de mercadorias. Os princípios utilizados ainda são os mesmos ditados pelos livros escolares de mais de meio século atrás.
Não há sintonia entre exigências de notas fiscais e barreiras alfandegárias que ainda vigoram nos sistemas tributários mundiais e a era eletrônica que está produzindo a quarta revolução industrial, a da indústria 4.0 e dos voos interplanetários ou da engenharia genética.
No mundo comandado por impulsos elétricos a cobrança de tributos deve ser automatizada, incidindo diretamente sobre a moeda eletrônica que circula no sistema bancário, dispensando assim a parafernália de regras, papéis e controles que impõem custos elevadíssimos para os governos e para as empresas. É a forma de tributação que se ajusta ao ambiente digital e que é capaz de corrigir distorções como a predominância de informações assimétricas no sistema econômico e a sonegação.
Nesse contexto de profundas mudanças a eficácia dos sistemas tributários atuais está sendo desafiada. Em realidade, o paradigma convencional está morrendo.
Doutor em Economia pela Universidade Harvard, professor titular de Economia na FGV. Foi deputado federal (1999-2003) e autor do projeto do Imposto único. É Presidente da Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP).
Publicado na Revista AMais e no Jornal SP Norte.