MARCOS C. CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE, JOÃO MARCUS M. NUNES E GILBERTO B. FAIWICHOW
Os resultados de algumas simulações referentes ao salário real, elaboradas com base na nova regra de reajuste do salário nominal e publicadas pela Folha em 19 de junho de 1987, geraram polêmica, o que era de certa forma esperado, dada a natureza emocional desse assunto.
As críticas feitas às projeções foram de duas naturezas: uma metodológica, que chegou até a acusar erros de cálculo, e uma segunda de natureza factual.
Quanto à primeira crítica, adotamos o critério de salários correntes nas simulações, enquanto vários outros estudos usaram um método de cálculo do salário médio que carece de significado econômico. Esse método considera o pagamento contratual pelos serviços prestados durante um mês, deflacionado pela inflação daquele mesmo mês. No entanto, essa abordagem não faz sentido, pois o trabalho realizado em um mês é remunerado no final do mês seguinte, sofrendo a corrosão da inflação durante esse período. O salário médio real de um mês deve refletir o poder aquisitivo dos gastos correntes, não o valor contratual real apurado no fim do mês de competência. Em nosso estudo, escolhemos como critério de recebimento o último dia do mês trabalhado, embora existam outros critérios (semanal, quinzenal, dia 10 do mês seguinte etc.). Com esses critérios, o gatilho acionado no mês t só afetará o salário real durante o mês t + 2, o que foi fonte de questionamento por parte de alguns críticos.
No que diz respeito à ponderação da inflação durante o mês em que os salários são gastos, adotamos a suposição de que o assalariado distribui seus dispêndios igualmente ao longo dos trinta dias do mês. Alguns criticaram essa suposição, argumentando que se os salários fossem gastos logo após o recebimento, as conclusões do estudo, principalmente o aumento do salário real em julho, caso a inflação fosse baixa, poderiam ser revertidas. Fizemos novas projeções incorporando essas críticas.
Em relação às críticas factuais, é importante destacar que as simulações realizadas se baseiam mais no espírito das regras salariais alternativas do que em sua letra. Por exemplo, não consideramos nas simulações o fato de que na data-base da categoria, tanto na regra Bresser quanto na regra gatilho, qualquer diferença entre o reajuste percebido e a inflação realizada seria automaticamente zerada.
As conclusões a que chegamos não foram revertidas, mesmo quando supomos que os assalariados gastem 80% dos salários nos primeiros dias após seu recebimento, redistribuindo igualmente o restante. A curva do salário real médio pode se deslocar para cima ou para baixo dependendo do padrão de gastos, mas não altera sua evolução, o que é do interesse prático da maioria dos assalariados.
É importante lembrar que a única conclusão permitida por nosso estudo e por qualquer outro nessa área é que os salários reais só se estabilizam e se recuperam em um ambiente de estabilidade econômica. Regras salariais factíveis não são independentes de outras regras de política econômica, como as políticas cambial, fiscal, monetária, distributiva ou industrial. A compatibilidade entre todas essas políticas é essencial para alcançar a estabilidade econômica duradoura.
MARCOS CINTRA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE, 41, doutor em Economia pela Universidade de Harvard (EUA), diretor da Fundação Getulio Vargas (SP) e consultor econômico da Folha;
JOÃO MARCUS MARINHO HUMES, 39, pós-graduado em Economia nos Estados Unidos, professor na Fundação Getulio Vargas (SP) e diretor do Econoplan Consultoria de Economia, além de mestrando em Economia e Planejamento;
GILBERTO B. FAIWICHOW, 29, engenheiro pela Fundação Getulio Vargas (SP).