Cada vez que a tarifa de transporte coletivo por ônibus, no município de São Paulo, é reajustada, reacendem-se as controvérsias acerca do ônus social que essa medida encerra, realçadas pela exploração política do tema.
O exame da evolução da tarifa, comparada com os níveis anuais de inflação, revela aumentos reais no preço da passagem. Não obstante, o sistema vem acumulando perda real de receita, quer devido a reajustes defasados; quer a correções defasadas e inferiores aos níveis de preços verificados em certos períodos abrangidos pela atualização; quer, ainda, devido à manipulação de sua recomposição em épocas pré-eleitorais.
Além disso, o sistema de transporte coletivo municipal vem enfrentando contínua e insuperável pressão de custos, gerada pela estrutura do mercado supridor de bens e serviços por ele demandados. De fato, aí atuam monopólios governamentais na oferta de energia; oligopólios privados fornecedores de veículos, peças e acessórios; e categoria profissional organizada em sindicato atuante e combativo. Os primeiros, observando o chamado realismo tarifário, buscam o restabelecimento de margens de resultado com a prática de aumentos reais de preços, como única forma de reiniciar investimentos na manutenção e expansão de seus serviços, face ao esgotamento das fontes tradicionais de financiamento; os fornecedores privados, reagindo aos aumentos de custos advindos da queda na escala de produção, ditada pela crise econômica, com a prática de aumentos de preços, de modo a assegurar ou alargar suas taxas de lucro, como lhes permite o exercício do poder de mercado; e a entidade de classe, clamando por reposição salarial, via de regra, tirando proveito da essencialidade do serviço.
Assim, pressionado entre a perda real de receitas e a elevação real e incontrolável de custos, o sistema está sempre correndo atrás de prejuízos e operando deficitariamente.
A contrapartida é o visível sucateamento da frota de ônibus e a frequente injeção de grande quantidade de recursos financeiros por parte da Prefeitura, visando à manutenção, ainda que precária, do "sistema municipal de transporte coletivo."
São conhecidas e fortemente sentidas as graves dificuldades sociais que a grande maioria dos municípios brasileiros vem atravessando, vitimada pelo declínio geral do nível de atividade econômica no país, há mais de uma década. No município de São Paulo, tais dificuldades são mais variadas e profundas, dada a magnitude de sua população e a sua expressão econômica. Aqui, vive-se, mais dramaticamente, a contradição entre a queda real do ingresso de receitas de impostos e taxas e o acirramento dos problemas e reivindicações sociais.
Nesse quadro, situa-se também a questão da tarifa do transporte coletivo, que, mensalmente, alimenta a Imprensa e suas manchetes.
Esse assunto ainda não foi abordado na sua real dimensão - não foi tratado como uma questão macroeconômica, mas, tão somente, como pretexto para exploração política local.
A competência para estabelecer diretrizes consistentes e duradouras de estabilização econômica é do Governo Federal. Sabe-se que as decisões em macropolítica, boas ou más, permeiam os demais planos da administração pública, as empresas e os indivíduos, vale dizer, repercutem em toda a sociedade. O imobilismo, nesse caso, também.
Certa está a atual administração ao enfrentar o problema do preço da passagem, bem como ao adotar outras importantes medidas relacionadas com o sistema de transporte coletivo, com o mesmo realismo com que as tarifas públicas vêm sendo calculadas nas demais instâncias governamentais. É uma atitude politicamente ingrata, mas própria de quem trabalha seriamente. Quaisquer colocações que não considerem o aspecto macroeconômico do tema são demagogicamente maldosos ou ingênuos.
Marcos Cintra - Vereador (PL)