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  • Marcos Cintra

E continuamos a jogar pérolas aos porcos...

Do pessimismo econômico que prevaleceu no país durante muitas décadas, passou-se agora a um certo ufanismo. Do Brasil sempre à espera do futuro, que demorava a chegar, passou-se à percepção de que este finalmente começou.


O importante intelectual francês Guy Sorman que, como seus colegas, sempre foi crítico das condições de vida e da desigualdade existentes no Brasil, escreveu recentemente que, pela primeira vez na história, a diferença entre ricos e pobres diminuiu, e que finalmente o país começa a explorar seu mercado interno, podendo dar início a uma etapa sustentada de crescimento econômico. No Brasil, o futuro chegou, diz Guy Sorman. Ainda mais significativo é que a dinâmica da economia mundial também mudou. Os emergentes crescem mais rapidamente que os países desenvolvidos e, apesar de continuar havendo grande interdependência, podem continuar crescendo, até puxar a economia mundial, mesmo com a desaceleração dos ricos. Nesse sentido, o Brasil precisa assumir o seu papel de uma das mais importantes e poderosas economias emergentes do mundo.


Mas, apesar de tudo, o Brasil ainda enfrenta amarras que impedem o seu potencial de ser concretizado. Alguns estudos buscam identificar os empecilhos nas instituições, tidas como ultrapassadas e ineficientes. Reformá-las seria a chave do sucesso. De fato, o Brasil continua sendo uma das economias mais difíceis do mundo para fazer negócios. De acordo com o último relatório do Banco Mundial (Doing Business 2008), o país ocupa a 122ª posição, a mesma de 2005, num rol de 178 nações. Em comparação com anos anteriores, a situação brasileira permanece incômoda. Em 2007, foram considerados 175 países e o Brasil ficou na 121ª posição; em 2006, ficou no 119° lugar dentre 155 economias analisadas.


Dentre os 10 itens considerados para a classificação de cada país no ranking final, a melhor posição do Brasil refere-se à proteção ao investidor (64ª). Depois vêm pela ordem: obtenção de crédito (84ª); comércio internacional (93ª); cumprimento de contrato (106ª); obtenção de alvarás (107ª); registro de propriedade (110ª), contratação de funcionários (119ª); abertura de empresas (122ª); fechamento de empresas (131ª); e pagamento de impostos (137ª). A pior posição brasileira se refere ao pagamento de impostos. O levantamento compreende quesitos como a quantidade de tributos em cada país, o tempo gasto para atender às exigências da legislação fiscal e o percentual que os impostos representam do lucro. Vale citar que, em conjunto, esses três indicadores colocam a economia brasileira (137ª) mais bem posicionada que emergentes como a Argentina (147ª), Índia (165ª) e China (168ª), porém, atrás de México (135ª) e Chile (34ª).


Com base em outro relatório, intitulado Paying Taxes 2008, produzido pelo Banco Mundial e pela consultoria PriceWaterhouseCoopers, a posição brasileira despenca para o 158° lugar quando se trata do percentual que os impostos representam sobre o lucro (69,2%). Pior que o Brasil nesse quesito ficam Argentina (172° - 112,9%), China (163° - 73,9%) e Índia (159° - 70,6%). O México (127° - 51,2%) e o Chile (18° - 25,9%) estão numa posição mais confortável. A situação relacionada aos impostos se torna dramática quando a pesquisa considera o tempo gasto por ano para cumprir a legislação em cada nação. O país ficou na penúltima posição entre as 178 nações, porque não há informações para a Namíbia. De acordo com o último Doing Business, a simplificação da estrutura tributária foi empreendida por 31 dos países considerados no levantamento. O Brasil, obviamente, não foi um deles. Muito pelo contrário, seguimos na contramão tornando um sistema ruim cada vez pior. Ainda mais quando se abre mão do único tributo simples e barato, que era a CPMF.


A contradição entre o potencial do Brasil e as condições objetivas nas quais sua economia funciona é causa de perplexidade. Sabemos o que devemos fazer, temos modelos a seguir, mas não conseguimos superar os obstáculos. Nossas instituições são ruins e não estimulam o crescimento, apesar das constantes tentativas de implantação de reformas de todo o tipo. Em muitos casos, existem boas leis, mas que aqui não parecem funcionar. A realidade é que não basta reformar. É preciso operar melhor.


Um instigante trabalho do National Bureau of Economic Research (Working Paper 10568) indaga sobre a causa do crescimento econômico, e testa a hipótese de que é a existência de boas instituições que motiva o desenvolvimento. Surpreendentemente, o estudo constatou que a causa do crescimento econômico é a educação, e que esta gera boas instituições propiciadoras de alto desenvolvimento econômico. É nisso que o Brasil precisa pensar mais seriamente. De que vale melhorar as condições materiais e fazer amplas reformas institucionais se o recurso humano ainda é deficiente e mal preparado? Os estudos mencionados acima mostram onde devemos aperfeiçoar nossas instituições, mas de que vale melhorar o ambiente institucional se acabam sendo pérolas jogadas aos porcos?


 

Marcos Cintra Cavalcanti de Albuquerque é Doutor pela Universidade de Harvard (EUA). Professor Titular e Vice-Presidente da Fundação Getulio Vargas. Exerceu mandato de Deputado Federal (PFL-SP) de 1999 a 2003. É autor de "A Verdade sobre o Imposto Único" (LCTE, 2003).

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