O regime de superávit primário foi um avanço para a gestão macroeconômica brasileira. Adotado em 1999, o sistema contribuiu para impor um princípio fundamental no trato do dinheiro público, que é a responsabilidade fiscal. Foi determinante para melhorar a confiança dos investidores no país, o controle da dívida pública e a redução do risco Brasil apurado pelas agências internacionais.
A retirada dos gastos do PAC foi apenas o começo do que se convencionou chamar de contabilidade criativa. As manobras orçamentárias para produzir os números desejados pelo governo foram pródigas mais recentemente e contemplaram medidas como a antecipação de dividendos das estatais, rubrica que envolveu triangulações entre bancos públicos e o Tesouro, e a obtenção de receitas extraordinárias, recursos que entram no caixa em um período e que não se repetem depois. Além disso, as manipulações envolveram alterações de regras inicialmente definidas na LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias), como a redução da meta e a desobrigação da União em compensar a meta não alcançada por estados e municípios.
Por fim, há ocorrências como o abatimento de desonerações tributárias, renegociação de dívidas tributárias e postergação de despesas. Nesse cenário marcado por mexidas casuísticas nas regras envolvendo as contas públicas, o governo acaba de anunciar o resultado primário em 2013. Divulgou que a "meta" de R$ 73 bilhões foi cumprida.
O superávit de R$ 75 bilhões, que era de R$ 108 bilhões na LDO para 2013, foi alcançado graças a R$ 35,3 bilhões de receitas extraordinárias geradas pelo Refis (parcelamento de dívidas tributárias) e pelo bônus de assinatura do leilão dos campos de petróleo do pré-sal. Entraram também para os cofres da União mais R$ 15 bilhões referentes a dividendos de estatais. Contribuíram também para o saldo abatimentos de gastos do PAC e de desonerações tributárias.
As "mágicas" orçamentárias do governo estão destruindo a credibilidade fiscal alcançada a duras penas. É necessário voltar a manter uma meta fiscal crível. É preferível o governo definir um superávit primário menor do que insistir em subterfúgios para alcançá-lo. A desconfiança e a incerteza elevam os riscos na economia e contribuem para adiar investimentos.
A frouxidão fiscal e as invenções do governo na apresentação das contas públicas preocupam. Se a irresponsabilidade fiscal continuar dando as cartas, os prejuízos serão crescentes para o país em termos de crescimento e estabilidade.