A CPMF está morta e seus algozes afirmam terem feito um favor ao país. Para eles, a contribuição era o pior dos tributos por ser regressivo e cumulativo. A primariedade de seu raciocínio chegou às raias da comicidade ao concluírem, horrorizados, que os gastos com o “imposto do cheque” superavam as despesas familiares com arroz e feijão! Resta indagar o que pensam então do ICMS e do Imposto de Renda que custa para a família mediana brasileira quase o mesmo que todas suas despesas com alimentação, saúde, educação, lazer, habitação, etc., incluindo o arroz e o feijão.
Esses mesmos adversários da CPMF serão chamados em breve a avaliarem seus tenebrosos diagnósticos contra o tributo, e “contrariis sensu”, a comprovarem os ganhos do país com a sua eliminação. Caberá a eles comprovar que a partir da sua extinção o país terá mais competitividade em suas exportações, os pobres comerão mais arroz e feijão, a distribuição de renda irá melhorar, as empresas não mais se verticalizarão, os salários reais aumentarão, os preços cairão e os bancos terão significativos aumentos de depósitos de clientes que guardavam dinheiro embaixo do colchão só para economizar impostos. Vamos aguardar ansiosamente esses dados.
Mas, e se o governo aumentar outros impostos para recompor a arrecadação perdida? Se “investir” mais no aumento da fiscalização e no confisco, como tem ameaçado? Na saúde, a CPMF representa 50% dos gastos federais e estaduais. É certo que, sem a CPMF, terá de acontecer cortes dramáticos nos serviços médicos e hospitalares à disposição do paciente. Estará finalmente aberto o caminho para a proposta do Imposto Único.
O ambiente político oferece hoje um oportuno espaço para a tramitação da emenda constitucional do Imposto Único. Se Lula não vetar a emenda do senador Jorge Bornhausen, conforme prometeu, e o PT não mantiver o fiel compromisso com o veto, essa tramitação poderá ocorrer ainda no primeiro trimestre de 2008, iniciando a fase final de sua aprovação.
A verdade é que a movimentação financeira se revelou um tributo justo, simples, barato, eficiente e que vem suscitado enorme interesse por parte de tributaristas como base de sustentação da base tributária do futuro. Não causou distorções no mercado, não distituiu exportações e nem desintermediação bancária. Ampliou o financiamento dos investimentos, incorporando às receitas públicas a arrecadação dos impostos sobre atividades subterrâneas. Revolveu a sonegação, evasão e elisão com uma incidência sobre o comércio de drogas, contrabando, atividades informais e corrupção.
A CPMF arrecadou R$ 32 bilhões e equivalia a 60% do IPI (R$ 28 bilhões) e a 40% do IRPJ (R$ 54 bilhões), sem as distorções danosas causadas por esses tributos, e poderia aumentar ainda mais a arrecadação para aliviar a carga sobre a folha de salários e os investimentos, baixar juros e acabar com a nefasta contribuição patronal sobre a folha, aumentando as ofertas de emprego formal e eliminando o déficit fiscal. Esse é o tributo que poderá salvar o fisco.
Agora, sem ela, pensar e debater a movimentação financeira é necessário ressurgir. Mas não como a CPMF de alíquotas fragmentadas e altas. A reforma tributária deve ser redirecionada para a modernização do sistema e a retomada do Imposto Único. Está na hora de repensar os paradigmas que norteiam o projeto de reforma tributária para o país.
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Marcos Cintra Cavalcanti de Albuquerque é doutor em Economia pela Universidade Harvard, prof. titular e vice-presidente da Fundação Getulio Vargas. E-mail: mcintra@marcoscintra.org