top of page
  • Marcos Cintra - Folha de S.Paulo

Controles nocivos

A excessiva ingerência do Estado na economia gera enormes distorções. Por um lado, nota-se que os mecanismos de intervenção não são eficazes e geram efeitos indesejáveis. Por outro, na tentativa de corrigir desvios, criam-se novas formas de controle que tendem a agravar o que se desejava corrigir.


Nesta semana, houve dois exemplos nítidos destes comportamentos. O primeiro foi o reconhecimento, por parte de técnicos do governo, de que o CIP estaria gerando uma rigidez para baixo das taxas de inflação, sem contudo impedir que ela se eleve. O segundo é o decreto 95.682 anunciado como um pacote antidéficit público.


No caso do CIP, foi explicitado o que muitos já suspeitavam. Quando a demanda está aquecida, abrindo espaço para aumentos de preços, é comum as empresas usarem artifícios para burlar o tabelamento. Segundo um documento preparado por técnicos do governo, existem quatorze maneiras que acabam tornando os controles de preços uma grande farsa. Quando a demanda está desaquecida, dificultando a elevação de preços, o CIP serve como um protetor para justificar remarcações. Nota-se, portanto, que a atuação do órgão não é capaz de evitar o aumento de preços; e pior, impede que eles caiam. Este é um exemplo claro de como um mecanismo criado apenas para controlar setores altamente concentrados - quando se justifica plenamente a intervenção pública - acaba se hipertrofiando com consequências altamente nocivas para a economia.


O outro exemplo está na última tentativa do governo de se autocontrolar, uma tarefa difícil numa estrutura agigantada como a sua. Para causar impacto, o governo tomou medidas draconianas de contenção de gastos. Mas a administração não detém os controles da máquina pública. Ignora as informações mais rudimentares para que qualquer administrador tome decisões racionais. Isto não impediu, contudo, que fossem anunciadas providências bombásticas, tais como total proibição de novas contratações (mesmo nos casos de cargos vagos), extinção de 40 mil vagas na administração direta, redução de 5% reais nas despesas das estatais, inclusive com pessoal, além de outras medidas, como o aumento para 40 horas da jornada de trabalho no serviço público.


Não há como criticar a intenção de controlar o déficit público. O que preocupa é que medidas genéricas tenham sido tomadas, aplicáveis a todas as empresas, independentemente de suas peculiaridades. Cortam-se despesas das boas e das más. Impedem-se contratações em setores estagnados e também naqueles mais dinâmicos, em fase de investimentos.


O correto seria uma avaliação criteriosa do universo do setor público capaz de identificar tratamentos diferenciados para situações distintas. O atual procedimento terá como resultado um conjunto de órgãos e empresas enfraquecidos; o setor público será cada vez mais um gigante subnutrido. Certamente existirão áreas de atuação governamental que exigem maiores investimentos, mais recursos para modernização e melhores salários, nos moldes das empresas privadas; outras deveriam ser privatizadas, por qualquer preço, pois apenas contribuem para acentuar o desequilíbrio financeiro do governo.


Não será com providências tópicas, de emergência, que serão equacionadas as contradições da presença do Estado na economia. Há necessidade de um programa abrangente de privatização, concomitantemente com planos de investimentos em setores onde a presença do governo seja essencial. A atual linha de conduta da administração apenas joga o problema para o futuro, e o resultado será um setor público cada vez mais incapaz de desempenhar suas funções, sem falar nos desequilíbrios financeiros que continuarão presentes.


 

MARCOS CINTRA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE, 41 anos, é doutor pela Universidade de Harvard (EUA), diretor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas e consultor econômico desta Folha.

Topo
bottom of page