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  • Marcos Cintra - Folha de S.Paulo

A urgência da privatização

O programa de privatização no Brasil é tão antigo quanto inoperante. Já em 1979, antes, portanto, que muitos países europeus se engajassem fortemente na redução da presença do estado em suas economias, o Brasil já tinha seu Programa Nacional de Desburocratização, no qual já estavam definidas algumas metas desestatizantes. Com a criação em 1981 da Comissão Especial para a Desestatização, que foi seguida pelo Conselho Interministerial de Privatização, previam-se que cerca de 140 empresas do setor público seriam transferidas para o controle privado.


Mas apesar de todo o aparato institucional criado para a obtenção desta meta, há poucos meses, o secretário-executivo do Conselho Interministerial de Privatização pediu demissão de seu cargo, desiludido, e alegando não ser possível, nas circunstâncias, ampliar o processo de privatização da máquina estatal, como seria desejável. Os resultados até então obtidos haviam sido decepcionantes, com realizações concretas tendo sido efetivadas apenas em minúscula parcela do setor estatal brasileiro.


Recentemente, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social vem fazendo esforço no sentido de transferir para a iniciativa privada ações de empresas sob seu controle, geralmente assumidas por aquela instituição através de programas de saneamento para devedores em dificuldades financeiras. No início do mês, realizou-se a venda de ações da Sibra Eletrosiderúrgica Brasileira S.A. Outras empresas, dentre elas a Aracruz e a Cosinor, também terão parte de seu capital transferido a empresas privadas.


Estes esforços ainda são incipientes, face à magnitude do projeto que, potencialmente, segundo o ex-titular da Comissão Interministerial de Privatização, Davi Moreira, teria condições de incluir um terço das sete maiores estatais brasileiras, nas quais se concentram 89% dos ativos, 93% do patrimônio líquido, 70% dos funcionários, e 87% da receita do setor produtivo estatal. É o caso das holdings Petrobrás, Eletrobrás, Vale, Telebrás, Porto-brás, Refesa e Siderbrás.


Não se deve ignorar as dificuldades inerentes a uma tarefa destas dimensões. Além do desequilíbrio financeiro que caracteriza muitas das empresas passíveis de serem privatizadas, há que se considerar a relativa escassez de capital do setor privado para assumir setores estatais de grande porte. Daí a necessidade de se adotar uma estratégia multifacetada de privatização. Venda de ações em Bolsas, transações envolvendo os próprios funcionários das empresas, flexibilização de novos investimentos privados nos setores a serem desestatizados, e o não repúdio à participação de capitais estrangeiros, são condições essenciais para que o projeto tenha maiores chances de sucesso.


Sabe-se que a capacidade instalada da maioria dos setores produtivos estatais não será capaz de suportar uma retomada do crescimento econômico. Daí a necessidade de alternativas capazes de evitar que uma reversão da tendência contracionista da economia - que já dá algumas mostras de estar ocorrendo - venha a ter fôlego curto.


Neste sentido, um programa de privatização mais agressivo é essencial não apenas do ponto de vista de maior eficiência destes importantes setores da economia mas também para evitar que, via estrangulamento de oferta, a evolução do nível de atividade no Brasil se caracterize por bruscas oscilações, como as que vêm ocorrendo nos últimos dois anos. Na atual conjuntura de profunda crise fiscal, a presença do governo no controle de setores existenciais da economia será o caminho certo para a continuidade da estagnação econômica, a médio e longo prazos.


 

MARCOS CINTRA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE, 41 anos, é doutor pela Universidade de Harvard (EUA), diretor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas e consultor econômico desta Folha.

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