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  • Marcos Cintra - Folha de S.Paulo

A inflação de indexadores

O Plano Collor optou por manter intactos os vários índices de custo de vida calculados pelo IBGE. Isso foi feito com o objetivo de evitar qualquer insinuação de manipulação dos indicadores de inflação. No entanto, o plano criou (embora não tenha calculado) um novo índice, livre da inflação anterior, dos meses anteriores e dos resíduos de inflação passada incorporados em contratos com reajustes de periodicidade mais longa que um mês, chamado índice ponta a ponta.


Agora, anuncia-se que o governo vai calcular mais dois indicadores de custo de vida: o Índice de Reajuste de Valores Fiscais (IRVF) e um índice bimestral, ainda sem nome, que medirá a variação do custo da cesta básica. Em resumo, há uma verdadeira inflação de índices de inflação.


IGP, IGP-M, IPC-Fipe, IPC Dieese-Seade, ICV-RJ, ICC, IPA... e mais os índices oficiais, IPC, IPCA, INPC, IRVF, o bimestral, etc.


A proliferação de índices causa enorme confusão na escolha do índice a ser utilizado como indexador. Além dos índices de inflação, ainda são utilizadas siglas como BTN, BTNF, VRF, o recém-criado IRVF e vários outros de uso mais restrito.


Em resumo, o número de indexadores e de índices de inflação está aumentando. E a multiplicidade de indexadores contribui para acentuar as incertezas, desorientando os agentes econômicos e, portanto, para a fixação de parâmetros de correção de preços que embutem taxas de risco crescentes. As próprias decisões do governo, que fixam casuisticamente a taxa oficial de inflação, o reajuste do BTN, ou o rendimento da poupança, contribuem para uma enorme variação nos critérios de fixação de preços na economia. Como resultado, crescem as tensões inflacionárias decorrentes da dispersão nas taxas de reajustes de preços.


Certamente, deve haver liberdade para as instituições privadas continuarem a produzir seus índices. Mesmo os indicadores oficiais devem ser mantidos, por razões estatísticas e para preservar as séries históricas iniciadas no passado. No entanto, é imperativo que o governo faça um esforço para impor a utilização de apenas um indexador nas relações econômicas.


Além disso, o indexador escolhido deve ser o mais simplificado possível. Deve incluir apenas produtos essenciais; os preços com variações cíclicas devem ser dessazonalizados; e os fatores acidentais devem ser excluídos. Em outras palavras, o indexador deve refletir apenas as variações de preços dos produtos essenciais, aos quais a maioria da população não tem alternativas de compra. Apenas as variações desses preços representam pressões inflacionárias sistêmicas e, portanto, devem compor um indexador geral.


É incompreensível que o preço de pesados agasalhos de inverno utilizados no Sul influencie os preços nas tórridas regiões do Norte; ou que uma seca em Mato Grosso afete diretamente o preço dos derivados de petróleo. Também não faz sentido incluir no cálculo do indexador o impacto de aumentos de preços de um Monza Classic ou dos táxis do Rio de Janeiro.


É necessário separar claramente o que é um indexador do que é um índice de custo de vida. O primeiro deve incluir apenas os produtos que fazem parte da cesta básica de consumo da maior parcela possível da população. Seria a interseção das cestas de consumo de todas as camadas da população. O segundo, por outro lado, deve refletir a especificidade do consumo de cada segmento da população. São conceitos distintos e não devem ser confundidos.




MARCOS CINTRA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE, 43 anos, é doutor pela Universidade de Harvard (EUA), diretor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas e consultor de economia da Folha.

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