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  • Marcos Cintra - Folha de S.Paulo

Desindexação equivocada

Contrariamente às afirmações de membros da equipe econômica, o Plano Collor 2 não desindexa a economia. Apenas altera os mecanismos de indexação. Antes, a inflação passada era utilizada como base da indexação, impondo enorme rigidez para baixo nas taxas inflacionárias. Havia ainda os inconvenientes de contaminação de preços correntes com eventos aleatórios ocorridos no passado.


Agora, o indexador — a TR — passa a ser determinado pelo mercado, com base nas expectativas. Em outras palavras, a taxa de indexação passa a ser, formalmente, o custo de oportunidade do dinheiro. Uma avaliação desta nova forma de indexação exige qualificações importantes. Cumpre diferenciar a indexação financeira da indexação de contratos futuros de venda e de prestação de serviços.


A indexação financeira de curto prazo pela taxa de juros flutuante é um aperfeiçoamento. O capital deve ser remunerado por seu custo de oportunidade, dado pela taxa de juros de mercado, e não por critérios que garantam a manutenção do poder aquisitivo do principal emprestado. Por outro lado, os contratos financeiros de longo prazo não se realizarão sem uma forte expectativa de um juro real positivo. A aplicação de indexação com base em índices de custo de vida, portanto, é uma necessidade nos contratos de longo prazo.


Outra dinâmica também determina o funcionamento dos mercados de bens e serviços. Não se trata mais de determinar uma indexação de acordo com o custo de oportunidade do capital, mas sim de garantir o valor real dos bens transacionados. Garantir o valor de reposição passa a ser a variável fundamental. Neste caso, a indexação pela taxa flutuante de juros irá introduzir enorme instabilidade no valor daqueles contratos, levando ao encurtamento de seus prazos. Dependendo das condições do mercado financeiro e da política monetária do governo, as taxas de juros próprias de cada setor da economia poderão flutuar violentamente de muito positivas para fortemente negativas. No caso de bens e serviços, a indexação com base em índices de preços não poderá ser evitada.


É certo que o uso de índices de custo de vida como padrão é uma aberração. Há que se introduzir correções. Por outro lado, a indexação financeira nos mercados reais poderá render problemas alocativos. Introduzem-se critérios rígidos de indexação, sem atentar às peculiaridades dos mercados a serem indexados.


MARCOS CINTRA CAVALCANTI DE AL-BUQUERQUE, 44 anos, é doutor pela Universidade de Harvard (EUA), diretor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas e consultor de economia da Folha.

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