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  • Marcos Cintra - Folha de S.Paulo

Improvisação


No começo, parecia ser uma característica elogiável do Plano FHC, mas que acabou revelando uma enorme dose de improvisação do programa antiinflacionário do governo.

O FHC não impôs regras rígidas de conversão de valores para a URV. Não foi um programa tecnocrático, recheado de tablitas, decretos e portarias que pretendessem abranger em seu conteúdo todos os casos que pudessem antever conflitos entre os agentes econômicos. Esta faceta do FHC foi unanimemente elogiada.

Mas a decepção não tardou.

Para ter sucesso, um plano de estabilização menos impositivo, como o que o FHC parecia ser, exige de seus executores algumas virtudes que a atual equipe econômica não demonstrou possuir. Credibilidade e capacidade de liderança. Credibilidade, para induzir a sociedade a creditar no sucesso da estratégia de estabilização; e capacidade de liderança, para evitar que os conflitos inerentes a processos de queda da inflação se transformem em instrumentos favorecedores de grupos econômicos, em detrimento de outros.

Infelizmente, o governo não demonstrou possuir nenhuma destas duas qualidades.

O período de conversão para a URV foi marcado por fortes surtos especulativos. Os preços aumentaram, segundo a Fipe, de 38% em fevereiro para 45% em maio; e de 40% para 45%, segundo o Dieese. Na cesta básica a inflação foi muito além, com perdas para os assalariados de baixa renda.

Por outro lado, alguns dos mais importantes preços da economia (mensalidades escolares, aluguéis e planos de saúde) foram deixados sem qualquer marco referencial de conversão. As negociações "livres" criaram impasses que o governo não está sabendo administrar, e que acabaram resultando em intervenções desastradas, como a regra aplicável às escolas. Tudo fruto da improvisação.

Mais grave ainda foi o fracasso da reforma constitucional. O que fora descrito pela equipe econômica como um elenco de condições fundamentais para a estabilização da economia, acabou abandonado pelo governo.


É pena. Começou bem, mas promete um final bem menos animador.

 

MARCOS CINTRA, doutor em economia pela Universidade Harvard (EUA), e professor titular da Fundação Getulio Vargas.

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