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  • Marcos Cintra - Folha de S.Paulo

A vingança dos contribuintes


Osiris Lopes Filho, ex-secretário da Receita Federal, foi vítima da mesma violência que praticou no cargo. Em nome da legalidade e da "moralidade" tributária, o ex-leão ameaçou, acusou e aterrorizou os contribuintes. No incidente com a bagagem dos campeões do mundo, Osiris sofreu na carne os efeitos da mesma truculência.

Por ordens superiores, Osiris foi obrigado a desrespeitar a lei. Sentiu a mesma agonia do pobre contribuinte quando, por impossibilidade material, é impelido a desrespeitar a lei.

O ex-leão foi implacável. Cobrou, prendeu e aumentou a carga tributária. A arrecadação quase dobrou, de US$ 3,3 bilhões mensais para US$ 6 bilhões previstos para dezembro.

E isso em um sistema podre, ineficiente, injusto e deturpado pela corrupção. Reproduzo agora frases tiradas da Folha, no último dia 23: "o sistema tributário no Brasil... não tem eficácia"; "as classes média e baixa é que pagam mais"; "a carga tributária é pior distribuída que a renda"; "os bancos não gostam de cumprir a lei do país"; "gostam de proteger interesses dos sonegadores"; "os assalariados pagam 70% dos impostos do país"; "dos 36 mil dirigentes das maiores empresas do país, cerca de 11 mil estão irregulares"; "continua entre US$ 40 bilhões e US$ 50 bilhões por ano entre omissão, inadimplência e sonegação"; "os dois maiores vilões são os sonegadores e os especuladores".

Não. Não são declarações subversivas de um revolucionário defensor do Imposto Único, mas do próprio ex-secretário.

E o que fez o ex-leão para reformar o sistema? Preferiu perpetuar suas distorções, impondo-o sem piedade.

Osiris se opôs à revisão do capítulo tributário da Constituição. Não atinou para o fato de que o contribuinte não tem uma natural propensão à malandragem. É vítima do caótico sistema tributário.

No fundo, Osiris é tão culpado pelo dramático quadro tributário quanto seus "superiores". A sonegação e o incidente com os futebolistas são facetas de um mesmo fenômeno: um sistema tributário falido, que deformou o comportamento do contribuinte.

 

MARCOS CINTRA, doutor em economia pela Universidade Harvard (EUA), e professor titular da Fundação Getulio Vargas.

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