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  • Marcos Cintra - Diário do Comércio

Os fatores negativos do empréstimo

Operações de empréstimo, como a que os EUA exigiram que o Brasil fizesse ao México, devem ser justificadas com realismo e transparência. Em uma economia assolada pela miséria e, portanto, carente de investimentos sociais urgentes, a concessão de crédito de US$ 300 milhões a um país estrangeiro só poderia encontrar resistências naturais. Daí a necessidade de justificativas plausíveis. A operação tem pontos favoráveis:


Mas não se poderia subestimar a inteligência do povo brasileiro, tentando convencê-lo de que se tratava de uma operação vantajosa do ponto de vista financeiro, como foi anunciado por algumas áreas do Governo. Poder-se-iam elencar algumas razões a favor do empréstimo, tais como:


  • A falência da economia mexicana poderia ter fortes impactos negativos na economia brasileira, na medida em que poderia gerar, se não houvesse esforços de neutralização, séria crise de confiança na recém-adquirida estabilidade do real. O efeito bola-de-neve de um eventual desastre econômico mexicano poderia levar de roldão a expectativa brasileira de atrair recursos externos para dar sustentação ao Plano Real.

  • A participação do Brasil no consórcio de países que concederiam recursos ao México facilitaria a aprovação pelo Congresso norte-americano do empréstimo de US$ 40 bilhões àquele país.

  • Mas a operação foi vetada pela maioria republicana que domina o Legislativo dos EUA, o que levou o presidente Bill Clinton a lançar mão de recursos disponíveis em fundos de estabilização sobre os quais possui autonomia operacional. Mesmo assim, um possível auxílio brasileiro sinalizaria a disposição de nosso governo em comprometer recursos escassos para conter possíveis prejuízos dos investidores internacionais. O Brasil estaria dando firme demonstração de seu propósito de preservar o bom relacionamento financeiro e comercial com os países industrializados, lançando as bases para a criação de mecanismos permanentes de apoio multilateral no enfrentamento de eventuais crises cambiais.


Tais argumentos, contudo, não se mostram suficientemente sólidos. O pequeno empréstimo brasileiro e de outros países em desenvolvimento seria simbólico na solução da crise. Mas também poderia ser simbólico da desatenção e descaso dos formuladores de política econômica desses países em relação aos seus problemas internos, quando cada centavo deve contar para atenuar seus níveis alarmantes de pobreza.


Além disso, a solução encontrada pelo presidente Clinton para viabilizar a ajuda ao México tornou o apoio brasileiro desnecessário do ponto de vista da opinião pública norte-americana. O que esteve em jogo foram os interesses das grandes praças financeiras internacionais. Portanto, a elas cabe encontrar saídas para a crise.


Igualmente frágil foi a alegação de que os investidores internacionais extrapolariam suas experiências no México para a realidade brasileira, transferindo, automaticamente, a crise para o Brasil. Os investidores detêm informações e conhecimentos mais do que suficientes para formar opiniões diferentes sobre realidades diferentes. Camuflar as mazelas mexicanas com operações de salvamento não enganaria os analistas internacionais.


O importante para conter a crise não é repetir erros que foram cometidos no México. O empréstimo, é preciso não se iludir, foi uma operação orientada tão somente para conter prejuízos imediatos dos investidores internacionais que foram com excessiva sede ao pote.


Uma coisa é certa, o empréstimo ao México significaria sacrifício para o Brasil, no atual quadro de penúria em que vive a maioria da população. As desastradas justificativas oficiais para a operação de socorro ao México revelam, na melhor das hipóteses, a insensibilidade do Governo, incapaz de constatar a inoportunidade do empréstimo.


Marcos Cintra é professor e doutor em economia pela Universidade de Harvard.

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