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  • Marcos Cintra - Folha de S.Paulo

Viva o torcedor, pau no marginal

A violência está na cabeça das pessoas. É absolutamente inócuo se imaginar que o uso, ou proibição, de símbolos, gestos, palavras de ordem ou uniformes, seria capaz de condicionar o comportamento das pessoas a favor, ou contra, comportamentos violentos. Portanto, acreditar que, proibindo o uso de camisas de times de futebol e desmantelando as torcidas organizadas, se estará acabando com a violência dos torcedores nos estádios de esportes é esperança tão vã quanto querer acabar com a velhice jogando fora as dentaduras postiças.


As torcidas organizadas não são causas eficientes, nem mesmo condição necessária para a violência entre torcedores. Quando muito podem ser fatores predisponentes. Mas isto não justifica acabar com a alegria e entusiasmo do torcedor que deseja acompanhar e prestigiar sua equipe de forma saudável, como sempre se fez no Brasil. Transformar as torcidas de futebol em multidões de zumbis, cabisbaixos e silenciosos, vai contribuir para acabar com os espetáculos futebolísticos ao vivo, transformando-os em shows que poderiam mais adequadamente ser realizados em estúdios de televisão.


Além disso, providências como proibição de bandeiras e camisas de clubes são medidas inócuas para desagrupar as torcidas. Sempre haverá formas de identificação das preferências dos torcedores. Mesmo que proibidos de usar camisas do time, o que os impedirá de usarem camisas com cores de suas equipes? Repito, a violência está dentro das pessoas, e é neste campo onde a batalha final contra a selvageria precisa ser travada e vencida. A educação pode moldar a personalidade de nossos jovens. É preciso educar, para destruir a violência em seu núcleo vital: em suas mentes. Neste aspecto, é toda a sociedade que precisa ser criticada. Na omissão das escolas, dos clubes de futebol e de nossas próprias famílias é onde encontraremos as verdadeiras razões para tanta violência.


Mas o problema é imediato, precisa ser resolvido rapidamente. A primeira medida a ser adotada é de natureza policial. A impunidade está na base da expansão da violência e da criminalidade no Brasil. Quem não fica estarrecido de ver que em vários episódios de violência entre torcedores a polícia militar se limitava a assistir impassível? Culpa dos PM's? É lógico que não. Como poderiam agir em tamanha desigualdade numérica e sem condições e treinamento especializado?


A violência já dá sinais de expansão há muitos anos, e até agora nada foi feito. Um exemplo é a depredação de ônibus usados no transporte das torcidas, como vem ocorrendo há muitos anos, sem qualquer medida efetiva de controle por parte das autoridades policiais. Foi preciso uma explosão de selvageria para que a sociedade resolvesse agir. Portanto, muito mais eficaz do que qualquer outra medida cosmética como proibição de uso de camisas, é fazer a autoridade policial exercer sua obrigação, coibindo, punindo e levando à justiça os infratores e agressores. Se o rigor da lei fosse aplicado no ato, sem contemporização, o problema desapareceria muito mais rapidamente do que se imagina.


Mais importante do que debates e gestos simbólicos de indignação seria a transmissão por televisão de cenas de camburões lotados levando os arruaceiros para a delegacia, e o rápido indiciamento dos criminosos. As camisas de clubes são bodes expiatórios. Servem apenas para desviar a atenção dos verdadeiros culpados: a omissão das autoridades policiais e a ineficácia dos dirigentes de clubes em transformar as torcidas organizadas em atividades saudáveis e formadoras de companheirismo e amizade.

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