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  • Marcos Cintra - Folha de S.Paulo

A contaminação do Simples

O simples, o imposto único das micro e pequenas empresas, foi um marco no processo de inovação tributária em nosso país. Em levantamento do Sebrae, o sistema foi avaliado como ótimo ou bom por 83% das empresas pesquisadas. Contudo há propostas envolvendo o Simples que podem representar retrocessos. A Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas propõe alíquotas nominais de 3% a 18% do faturamento e acréscimos no tributo devido diferenciados por atividade. Para o comércio, não haveria adicional na alíquota; para a indústria, propõem-se 16%; para os serviços profissionais, 60%; e, para outros serviços, 30%. Cumpre questionar por que as alíquotas precisam ser aumentadas. Argumentar que a receita do Simples, com os novos limites de enquadramento, tem que se manter nos patamares atuais não encontra respaldo na Constituição e nega o intuito de tratamento diferenciado às micro e pequenas empresas. Ademais, aplicar alíquotas marginais de mais de 20% da receita bruta é um gritante estímulo ao subfaturamento. As regras prevendo a aplicação de redutores e acréscimos setoriais contidas na Lei Geral para apurar o imposto a pagar vão tornar o Simples tão complexo como o sistema convencional. Cabe avaliar o impacto setorial da proposta para duas hipóteses de faturamento (veja quadro).

Os prestadores de serviços continuam sendo as presas prediletas do fisco. No primeiro caso, microempresas com faturamento de R$ 5.000 teriam carga tributária de 3,5% no setor industrial, enquanto um prestador de serviços profissionais seria onerado em 4,8%. Já uma empresa de pequeno porte com faturamento de R$ 250 mil teria uma carga tributária de 13,4%, no caso de uma indústria, e de 18,5%, se for um prestador de serviços. Os grandes vilões no âmbito federal para o setor de serviços são o IRPJ e a CSLL, tributos que o governo tentou elevar, sem sucesso, na MP 232. A Lei Geral pode ser a nova roupagem para a Receita onerar os profissionais liberais. Importante atentar também para a falta de sinceridade das explicações do governo para as pesadas sobretaxas sobre os prestadores de serviço. A alegação de que poderão causar grandes perdas ao INSS por serem atividades intensivas em mão-de-obra não encontra respaldo nos critérios de divisão de receitas, pois mesmo com os pesados acréscimos a parte da Previdência no recolhimento do Simples pelos prestadores de serviços profissionais é menor que na atividade industrial. O aperfeiçoamento do Simples reside na adoção da movimentação financeira como base de sua incidência. Um adicional sobre a movimentação financeira das empresas optantes geraria arrecadação equivalente, com subprodutos positivos imediatos como alíquotas mais baixas, menor evasão e maior simplificação.

 

MARCOS CINTRA, doutor em economia pela Universidade Harvard (EUA), professor titular e vice-presidente da Fundação Getulio Vargas.


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