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  • Marcos Cintra - Revista Conjuntura Econômica

Energia e telefonia: tributos e chiados

O Brasil tem uma estrutura tributária absurdamente fora dos padrões internacionais. Tanto a carga global de impostos como a que incide sobre diferentes setores da produção e de bens e serviços estão em descompasso em relação às que são observadas em outros países. Dois exemplos dramáticos são os setores elétrico e de telefonia. Ambos, ainda que estratégicos e essenciais para o desenvolvimento, são vítimas de agressivas ações fiscalistas do governo. A intenção de concentrar a extração tributária sobre bases que garantam arrecadação de modo fácil, levou a telefonia do país a ser uma das que mais pagam imposto no mundo. Países como Canadá, Estados Unidos, Coréia e Austrália cobram no máximo 10% sobre o valor das tarifas de telefone fixo. Na Espanha, Alemanha, Portugal e Inglaterra a carga não chega a 20%. Na Argentina é de 21%. No Brasil ela ultrapassa 40%


No caso de telefonia móvel os impostos representam 30,4% da receita das operadoras, conforme estudo apresentado recentemente pela GSM Association, entidade que representa fabricantes de telefones celulares. O trabalho revela ainda que num ranking de 50 países o Brasil é o terceiro que mais aplica tributo sobre serviços de telefonia móvel.


A questão dos impostos e encargos incidentes sobre as telecomunicações no Brasil chama a atenção não só pelo excessivo ônus sobre o setor (estima-se que ultrapasse 57% da receita líquida), mas também pela utilização de recursos gerados no segmento, que são desviados para outros fins que não a reaplicação no próprio setor, como acontecia anteriormente. O Fust, Funttel e Fistel são recolhidos pelas empresas de telefonia para que o governo aplique esses recursos na fiscalização das atividades, no custeio de pesquisa e na universalização da telefonia e da internet. Porém, de 2001 a 2005, dos R$ 17,5 bilhões arrecadados, 90% foram desviados para a obtenção do superávit primário.


Outro exemplo de super tributação setorial ocorre em um insumo de grande peso para o setor produtivo.


A indústria e o comércio absorvem 60% da energia elétrica consumida no país. Esse item, que deveria ser um fator de competitividade na economia, acabou se tornando um entrave por conta do elevado custo que representa nos custos de produção das empresas.


Segundo a Agência Internacional de Energia (AIE), a tarifa de energia elétrica no Brasil é mais cara do que em países como Reino Unido, Espanha, França, Suécia, Estados Unidos e Canadá. Essa informação chama a atenção porque naqueles países a energia consumida provém basicamente de termoelétricas, que têm custo de produção mais elevado que as hidrelétricas, que, por sua vez, representam 80% do consumo de energia no Brasil. Ou seja, o brasileiro consome energia de uma fonte mais barata que a dos países ricos, mas paga tarifas significativamente mais altas.


A elevada carga tributária incidente sobre a energia elétrica é um fator de peso para o país registrar uma das tarifas mais caras do mundo. Um estudo da Price Waterhouse-Coppers revela que os impostos e encargos representam 52% da receita bruta do setor, que é onerado por dez impostos (IRPJ, CSLL, PIS, Cofins, CPMF, ITR, ICMS, IPVA, ISS e IPTU), cinco contribuições sociais (INSS, FGTS, Seguro Acidente do Trabalho, Salário-Educação e Sistema “S”) e uma série de encargos setoriais (Conta de Consumo de Combustíveis, Reserva Global de Reversão, Taxa de Fiscalização, Contribuição ao Operador Nacional do Sistema, Conta de Desenvolvimento Energético, entre outros).


Segundo a OCDE, a carga tributária (exceto encargos) sobre as tarifas de energia elétrica incidente sobre os consumidores industriais não chega a 10% em países como Espanha, Reino Unido, Japão, Dinamarca e Holanda. No Brasil, é da ordem de 36%.


As empresas de telefonia e de energia elétrica viraram grandes coletoras de impostos. No caso do ICMS, o imposto de maior peso no sistema brasileiro, a receita dos setores de telecomunicação e de energia representa 12% e 11%, respectivamente. Ademais, esse tributo, assim como o PIS/Cofins, carrega uma forma de apuração que magnifica os seus efeitos fiscais, que é a cobrança “por dentro”. Ou seja, a inventividade fiscal no Brasil é tamanha a tal ponto de se cobrar imposto sobre o imposto. A hiper tributação sobre energia e telefonia é mais uma aberração brasileira que trava a economia e penaliza os contribuintes. Mas, para o governo isso é cômodo, já que garante receita sem muito esforço.


Vale lembrar a frase do grande ministro francês Colbert, que dizia que a arte de tributar é como arrancar dos gansos a maior quantidade de penas com a menor chiadeira possível. No caso da energia e da telefonia, a chiadeira é geral.



Marcos Cintra

Doutor em Economia pela Universidade Harvard (EUA),professor titular e vice-presidente da FGV


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