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  • Marcos Cintra - Revista Conjuntura Econômica

Com a TPP o Brasil vai ficando pra trás

O mega acordo comercial entre os Estados Unidos, Japão e outras dez economias do Pacífico coloca o Brasil em estado de alerta. A aprovação da Trans-Pacific Partnership (TPP) representa um bloco econômico que reúne 40% do PIB mundial e 793 milhões de consumidores. Esse pacto, o maior da história, visa eliminar barreiras alfandegárias entre seus membros, e a expectativa é que em 2025 o movimento anual de bens e serviços entre as 12 nações atinja US$ 223 bilhões.


A aprovação da TPP deixa o Brasil em situação extremamente desconfortável. O país terá que rever sua política comercial, deixando de lado aspectos de natureza ideológica, que ao longo dos últimos anos comandaram as ações externas, e se pautar por questões de ordem técnica e pragmática, se a opção for a inserção do comércio internacional como fator relevante para o desenvolvimento econômico.


O Brasil tem adotado uma postura absolutamente ineficaz no sentido de expandir sua participação no comércio mundial. Um aspecto nessa direção foi ter optado em focar no Mercosul com todas as suas debilidades e nele se sujeitar repetidamente às imposições da Argentina. O protecionismo argentino prevaleceu, e o governo brasileiro se comportou de modo passivo frente a essa situação. Além disso, o país não foi capaz de liderar ações para livrar o bloco de uma de suas maiores amarras, que é a obrigatoriedade de negociar acordos de livre-comércio em conjunto. Oportunidades são perdidas porque há proibição de pactos dos países membros com outros blocos. Com a TPP, seguramente haverá forte pressão para que haja flexibilização dessa regra, e o Brasil deve capitanear esse processo.


Outro aspecto negativo do governo brasileiro diz respeito à prioridade dada às ações junto à Organização Mundial do Comércio (OMC), se queixando de concorrência desleal. O foco foi reclamar do protecionismo de nações, principalmente dos países asiáticos, cujo efeito foi pífio sobre a atividade doméstica, em vez de investir em uma dinâmica comercial global que cresce de modo acelerado. Entre 2001 e 2014, as exportações mundiais passaram de US$ 6 trilhões para US$ 19 trilhões.


É certo que o Brasil terá que reduzir seu ímpeto em torno de medidas antidumping com a criação da TPP. O peso das regras do acordo do Pacífico deve ir além dos termos que servem de base às análises da OMC, cujas normas atuais devem ser relegadas a segundo plano.


Um terceiro ponto a ser ressaltado trata-se da Área de Livre-Comércio das Américas (ALCA), que o país rejeitou com base em argumentos que foram muito mal conduzidos. Vale destacar que o governo Fernando Henrique Cardoso foi o grande responsável pelo fracasso da adesão do Brasil ao bloco proposto na Cúpula das Américas em 1994 com o objetivo de eliminar as barreiras alfandegárias entre os 34 países americanos.


Um ponto fundamental quando da sua discussão se referia à competitividade da economia brasileira frente à norte-americana. Argumentava-se, de modo equivocado, que a maior produtividade global da economia dos Estados Unidos inviabilizaria o setor industrial brasileiro.


Na verdade, o que rege as trocas internacionais são as vantagens comparativas e não as vantagens absolutas. Nesse sentido, a ALCA teria permitido ao Brasil maior acesso aos mercados industriais tradicionais dos Estados Unidos, como o de aço, calçados, têxteis, vestuário, couro, material de transportes e segmentos de alimentos processados, como o de suco de laranja. Esses setores da economia brasileira estariam concorrendo com países de desenvolvimento intermediário como o México, Venezuela, Colômbia e Argentina, e não com a economia norte-americana, que há tempo tornou-se importadora desses produtos. A indústria norte-americana se concentra nos segmentos de alta tecnologia, como informática, telecomunicações, química fina, fibras óticas, aeronáutica de grande porte e outros setores de alta relação capital/trabalho. Essas indústrias não competem com a indústria nacional.


A ALCA teria sido um importante fator de estímulo para o crescimento do setor industrial brasileiro, o qual, ainda que concentrado nos ramos tradicionais, já passou pela abertura comercial do início dos anos 90, atingindo índices de eficiência e qualidade que lhes garantiriam competitividade frente aos seus concorrentes dentro do mercado norte-americano.


Historicamente a política comercial brasileira foi equivocada, e isso pode ser exemplificado através da evolução do país no comércio mundial desde o final dos anos 40. Naquela época, o Brasil tinha uma participação no fluxo internacional de apenas 1,8%, e em 2013 ela foi de 1,4%. No mesmo período, o Japão saiu de 1,1% para 4,5%, e a China de 0,9% para 12,1%. Outro dado importante também ajuda a mostrar que o país fracassou com suas ações comerciais. Entre 2001 e 2014, as exportações mundiais em relação ao PIB mundial passaram de 18,4% para 24,2%. No mesmo período, as exportações brasileiras em relação ao PIB doméstico saíram de 10,5% para 10%.


O Brasil está ficando cada vez mais para trás no mundo globalizado. A economia brasileira é uma das mais fechadas do mundo e está ameaçada de ficar cada vez mais isolada no comércio internacional. Será imprescindível rever o posicionamento do país em relação à ALCA, ao Mercosul e agora à TPP. Corremos o risco de perder mercados importantes como o México, Chile e Peru, que fazem parte do acordo do Pacífico. A Colômbia pode aderir a ele mais à frente.


De um modo geral, há três recomendações importantes que devem guiar as discussões em um processo de inserção do Brasil no fluxo global de bens e serviços. A primeira se refere à necessidade de o país jogar de forma coordenada nos vários tabuleiros (União Europeia, OMC, ALCA, Mercosul e TPP) e ainda ampliar as negociações visando a acordos comerciais bilaterais. Outro ponto relevante é considerar a diversidade das condições de competitividade de cada setor na economia brasileira, algo que demanda a necessidade de programas setoriais domésticos de capacitação e aumento de produtividade naqueles com maior dificuldade para competir. Por fim, há a necessidade de mais e melhores estudos acerca das condições específicas da competitividade da produção nacional para equipar os negociadores e agentes públicos envolvidos na formulação das políticas de integração com dados sobre os produtos "sensíveis" em nossa pauta comercial.


Os riscos associados à abertura econômica são grandes, assim como as oportunidades que esse processo oferece. Isso faz parte do jogo. A formação da TPP é uma realidade, e ela está aberta a novas adesões, inclusive ao Brasil. O país deve defender seus interesses no processo de negociação e se ajustar a ele de tal modo que possa atuar de modo competitivo no cenário que está se desenhando e, dessa forma, ampliar sua participação no fluxo global de bens e serviços.



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