A economia aquecida, combinada com a carência de pessoal qualificado, está forçando a entrada de trabalhadores oriundos de outros países no Brasil. O número de autorizações concedidas pelo Ministério do Trabalho e Emprego para estrangeiros saltou de 25.440 em 2006 para 42.914 em 2009, um crescimento de 69% no período, e em 2010 elas podem ultrapassar a marca de 46 mil.
Cabe destacar, no processo de importação de mão de obra no Brasil entre 2006 e 2009, o expressivo aumento de profissionais com nível de escolaridade superior ou habilitação legal equivalente, que evoluiu 108%, e o de pessoas com segundo grau completo ou curso técnico, que cresceu 92%. No primeiro caso, as autorizações no período saltaram de 11.976 para 24.856, e no segundo tipo de registro, elas passaram de 8.609 para 16.538.
O crescimento da entrada de mão de obra originária de outros países demonstra a escassez de trabalhadores especializados para atender, em parte, a demanda por profissionais em áreas que contemplam transferência de tecnologia de ponta, como as de petróleo, gás e infraestrutura. Mas, expõe também a fragilidade do país no campo educacional, mais especificamente no que tange à qualificação do trabalhador brasileiro.
Para se ter uma ideia mais completa a respeito da deficiência em termos de suprimento de mão de obra capacitada, o IBGE divulga em sua pesquisa mensal de emprego e desemprego que dos 1,6 milhão de pessoas sem ocupação nas seis regiões metropolitanas do país no mês de junho, 946 mil têm onze anos ou mais de estudo. Ou seja, esse contingente tem o mesmo grau de escolaridade que os 16.538 estrangeiros que entraram para trabalhar no país no ano passado. Nos três primeiros meses deste ano, a importação de profissionais com segundo grau completo ou curso técnico foi de 4.614 pessoas.
A maior demanda por trabalhadores qualificados é uma tendência mundial e representa um fator com peso cada vez maior em termos de competitividade para as economias. A crescente importação de mão de obra pelo Brasil, a sobra de vagas de trabalho em determinados setores da produção nacional e a manutenção de um grande contingente de desempregados com elevado nível de ensino revelam que a questão da qualificação profissional no país precisa ser revista.
É necessário repensar a qualificação do trabalhador brasileiro em todos os seus níveis, de tal forma que ela se torne uma política pública com ações de curto, médio e longo prazos e envolva o governo em seus três níveis, o setor produtivo, as entidades de classe e as universidades. O poder público poderia, por exemplo, criar mecanismos para estimular convênios entre empresas e escolas técnicas e de nível superior.
Outra medida para compor uma política nacional de qualificação seria vincular todas as transferências de renda de natureza assistencial a cursos de treinamento de trabalhadores. Os beneficiários de programas como o Bolsa Família e o Seguro Desemprego, por exemplo, somente teriam direito aos recursos se estivessem matriculados em programas de capacitação profissional.
Marcos Cintra é doutor em Economia pela Universidade Harvard (EUA), Professor Titular e Vice-Presidente da Fundação Getulio Vargas.
Publicado na Revista Varejo & Tecnologia: Outubro de 2010
Publicado no Jornal SPNorte: 20/08/2010