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Flávio Rocha

A proposta do Imposto Único está madura

Flávio Rocha 

Jornal da Tarde, 29/11/91


O Imposto Único acaba de passar por mais um duro teste, o crivo do tributarista Clóvis Panzarini. Seu artigo no JT de 27.11.91 levanta pontos pertinentes discutidos durante a fase inicial de discussão de nossa emenda, e apenas vem reforçar a certeza de que estamos diante de uma proposta madura e pronta para implantação efetiva. Vamos aos pontos levantados pelo tributarista:


1   - Nem o mais apaixonado opositor do Imposto Único o acusa de provocar regressividade. Na pior das hipóteses, ele é rigorosamente proporcional. Esse fato constituiria, por si só, apreciável evolução em relação ao enormemente regressivo sistema atual. Dois fatores determinam a injustiça e a regressividade que o sistema tributário brasileiro comete contra o contribuinte. Primeiro, a carga fiscal sobre a folha de pagamentos. O trabalhador trabalha um dia para si e outro para o governo. Somos um País de salários miseráveis e custos de mão-de-obra altíssimos, em decorrência de um sistema que pune fortemente a base salarial. Como o trabalhador é o único agente econômico que não pode optar pela sonegação, cada vez que o governo precisa de dinheiro, está atingindo aquele que tem mais dificuldades em se desvencilhar da malha. Isso faz com que o Brasil possua uma das mais altas cargas tributárias sobre salário.


Outro fator de regressividade é a grande incidência de impostos indiretos, os mais regressivos. Um trabalhador de salário mínimo gasta 100% do que ganha enquanto consumidor, e a incidência média dos impostos indiretos é de 44%. Um marajá, que gasta 10% de sua renda e poupa 90%, estará pagando os mesmos 44% apenas sobre os 10% que consumiu - ou seja, 4,4% da receita total.


O sistema tributário atual é atualmente regressivo, e uma evolução para o sistema proporcional já seria um grande avanço, apesar de o imposto único possuir fortes elementos de progressividade. O ideal seria que tivéssemos um sistema perfeitamente proporcional, até um pouco progressivo do lado da arrecadação, com a justiça social do lado do gasto. A progressividade tributária vem sendo questionada em todo o mundo, porque traz consigo um subproduto socialmente indesejável, que é a evasão de capitais. Países com sistemas tributários fortemente progressivos estão revendo inteiramente seu conceito para conviver com as características do mundo moderno - a volatilidade e a fluidez do capital.


2   - O efeito do Imposto Único sobre as exportações. Não é verdade que o IU inibe as exportações, incidindo em cascata, não permitindo a competitividade plena. Os exportadores estão de acordo que o Imposto Único, mesmo que não fosse desonerado, provocaria aumento de competitividade muito grande para os produtos exportados. Desoneramos apenas ICMS e IPI, por meio de manobras contábeis. Mas exportamos os outros impostos, inclusive aquele que mais tira competitividade do produto brasileiro no Exterior, o imposto burocrático. Os produtos finais são onerados por máquinas burocráticas altamente custosas. O que vai mudar, portanto, é a metodologia para desonerar a carga tributária nos impostos exportados. Hoje a desoneração ocorre por meio de lançamentos contábeis. A desoneração do IU na exportação será feita pelo rebate fiscal, por meio da devolução do imposto no ato da exportação.


3   - A questão da partilha. O critério da partilha não será político, como sustenta o tributarista Panzarini. O Imposto Único pressupõe a automatização da partilha, que é onde estão as grandes brechas para a corrupção. O IU acabará com a corrupção fiscal, por meio da automatização de arrecadação, e com a corrupção na partilha das verbas. Hoje, a Comissão de Orçamento dispõe das verbas da União sem nenhuma transparência. Decide tudo em recinto fechado. E isso provoca distorções. Temos o exemplo do município de Serra Dourada, na Bahia, com 17 mil habitantes, que recebe 10 vezes mais que Curitiba e 15 vezes mais que Belém. Com o IU, o Congresso votará o critério de partilha, acabando com as posições pessoais, e o critério populacional será o adotado. A população é quem gera a demanda social do imposto. Camaçari, com 20 mil habitantes, retira hoje cerca de 30% do ICMS na Bahia, apesar de já ser beneficiada com os frutos de um pólo petroquímico de bilhões de dólares. Salvador, com graves problemas, vive com verbas bem menores. A partilha automática será a redenção dos Estados e municípios. Hoje os municípios arrecadam 0,8% do PIB e gastam quase 10 vezes isso. Essa diferença é perseguida por meio da nefasta política do "pires na mão". O IU irá acabar com esse estilo. Diariamente, serão creditadas nas contas dos 4.521 municípios, dos 27 governos de Estado e da União as suas cotas-partes, eliminando-se a multiplicidade dos estágios decisórios, imensos focos de corrupção.


4   - A questão da elisão fiscal. Duas providências de natureza administrativa eliminam inteiramente a possibilidade da elisão fiscal. O risco de o cheque circular entre empresas com endossos sucessivos será extinto por meio de medida que tornará cada endosso uma transação. Quem apresentar cheque com 5 endossos no verso deverá pagar não 1 %, mas 6% - 1 % relativo à transação original e mais 1 % para cada endosso. O cheque ao portador que circular indefinidamente, sendo apresentado pelo último que vai preencher o campo, será criminalizado. A penalidade será uma multa no valor do cheque, imposto à pessoa que apresentar o cheque: quem emitir um cheque ao portador correrá o risco de pagá-lo em dobro.


5   - O custo da administração fiscal. Não devemos considerar apenas os custos internos da máquina administrativa. Temos de computar com o ônus do sistema tributário outros custos. O renomado tributarista Eivany Silva, que já foi uma das maiores autoridades da Receita Federal, contabilizou em 8% do PIB o peso morto do imposto. Não é, portanto, 4% como lembra o tributarista Panzarini. O professor Silva diz que 3% é o que custa ao governo fiscalizar os 58 tributos, cabendo 5% à sociedade. Esses 8% incluem custos de regulamentação, da legislação, custos do judiciário, do aparato burocrático. Temos um Judiciário entupido com ações tributárias e um contencioso monumental. Quanto custa isso? Tivemos no ano passado 1.602 legislações tributárias, o que dá quase 8 por dia útil. Temos de considerar o aparato burocrático das empresas, duas contabilidades - uma gerencial e outra fiscal. Tudo isso gera os 8% do PIB que constituem peso morto do imposto. Se colocássemos esses recursos para a atividade produtiva, para salários, para investimentos, o impacto econômico seria brutal.


São essas as questões que compõem a moldura da verdade do Imposto Único.

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