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  • Marcos Cintra

O mito da regressividade

A necessidade de um ajuste fiscal no Brasil trouxe de volta a discussão sobre o possível retorno da CPMF. Por conta disso, várias críticas ressurgiram envolvendo essa forma de tributação, e todas precisam ser avaliadas de modo técnico. Uma das críticas é que esse tipo de tributo é regressivo, ou seja, imporia maior ônus às famílias de baixa renda.


Este texto procura expor que há um mito envolvendo a questão da regressividade da CPMF. É necessário debater exaustivamente esse e outros aspectos técnicos envolvendo os impostos para que a sociedade se posicione em relação à reforma tributária ideal para o país.


Cabe citar que a CPMF, como mais um tributo, deve ser rejeitada. Só valeria a pena recriá-la se fosse para substituir vários dos atuais impostos. Trata-se de uma forma de tributação eficiente, mas seus críticos insistem em dizer que ela é regressiva, quando na verdade estudos mostram que esse tributo é proporcional.


Produzi uma simulação quando a CPMF vigorava para aferir a tão alegada regressividade. Utilizando quatro faixas mensais de renda familiar, apurei que essa crítica é insignificante. Na menor faixa de rendimento (R$ 454,69), a CPMF (direta e indireta) representava 1,64% da renda; na segunda (R$ 1.215,33), 1,58%; na terceira (R$ 2.450,05), 1,51%; e na quarta (R$ 8.721,92), 1,41%.


No artigo "Imposto sobre Circulação Financeira," publicado na Folha em 24/9/95, a então deputada federal Maria da Conceição Tavares descreveu o resultado de uma simulação para apurar a suposta regressividade do IPMF, posteriormente batizado como CPMF, sobre as pessoas físicas e concluiu que esse tipo de tributo recai fundamentalmente sobre o segmento de maior renda. Segundo ela, é falso o argumento de que o imposto pune basicamente os mais pobres, uma vez que, em seus exercícios, constatou-se que as alíquotas médias efetivas são maiores para as camadas de renda mais alta.


Conclusões semelhantes foram publicadas por Nelson Leitão Paes e Mirta Noemi Sataka Bugarin no estudo "Parâmetros Tributários da Economia Brasileira," publicado na Revista de Estudos Econômicos - FEA-USP (out-dez/2006). Os autores concluem que a CPMF é o imposto mais harmonioso do sistema tributário brasileiro. O ônus desse tributo sobre o orçamento das famílias era de 1,3%, ou seja, ele é uniforme em qualquer faixa de renda, não é regressivo. O trabalho mostra ainda que, entre os tributos mais prejudiciais em termos de impacto sobre as famílias de baixa renda, o ICMS, tido pelos críticos da tributação sobre movimentação financeira como um imposto justo, é um dos mais importantes.


Pode-se concluir que a tese da regressividade da CPMF tem pés de barro. É um mito que se desfaz. Antes de repetir, sem a necessária análise, alguns conceitos heurísticos de livros-texto de economia, os críticos dessa forma de tributação devem saber que a questão exige avaliação técnica cuidadosa.


 

Marcos Cintra é doutor em Economia pela Universidade Harvard (EUA) e professor titular de Economia na FGV (Fundação Getulio Vargas). Foi deputado federal (1999-2003) e autor do projeto do Imposto Único. Atualmente, ocupa o cargo de Subsecretário de Ciência e Tecnologia do Estado de São Paulo.


Publicado na Revista Amais: Julho de 2015

Publicado no Jornal A Gazeta Regional (Caçapava-SP): 29/05/2015


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