Segundo o comportamento ciclo tímico das expectativas de estabilização no Brasil, ocorreu nos últimos dias uma reversão nas previsões otimistas dos agentes econômicos. A taxa de inflação continua mostrando grande resistência à terapia recessionista. Apesar do aumento do desemprego, dos elevados juros reais, da contração da demanda e da redução da produção e do comércio, os aumentos de preços continuam acima dos 20% ao mês.
Era previsível. O governo está praticando uma política econômica capenga, centrada quase exclusivamente na política monetária. E, infelizmente, não aproveitou a relativa calmaria dos últimos meses para impor reformas estruturais, especialmente o ajuste fiscal.
Mais grave ainda é que ao não fazer a reforma fiscal, o governo se meteu em uma armadilha. Não pode reduzir os juros internos pois precipitaria grandes perdas de reservas, além de excitar a demanda em uma conjuntura de oferta decrescente; e aumentá-los poderá sinalizar uma expectativa de inflação crescente e aprofundar a recessão além da capacidade de tolerância da sociedade.
Não se pode confundir a mera contenção de gastos públicos com um verdadeiro ajuste fiscal. A administração está só sufocando as atividades típicas de governo, como educação, saúde e infraestrutura. Em realidade não houve um ajuste consistente. O que interessa conhecer é o déficit público de pleno emprego, e não o fluxo de caixa em uma conjuntura fortemente comprimida como agora.
Com o nível atual de gastos públicos não há como sustentar uma retomada do crescimento econômico. Não há como esperar que se recupere o nível de arrecadação, pois o sistema tributário está desintegrado, agonizante.
Além disso, a política cambial e os elevados juros internos geraram um círculo vicioso que agrava as perspectivas sombrias de um crescente desequilíbrio fiscal. A dívida mobiliária interna cresce, e os encargos se multiplicam, passando de 2,5% da receita líquida, no primeiro trimestre de 91, para 7,5% em igual período deste ano.
Cabe aqui um alerta. Da mesma forma que o ajuste fiscal não é só cortar gastos atabalhoadamente, também não pode ser uma histérica busca de novas receitas. Há que se redesenhar o quadro de funções do poder público e compatibilizá-lo com um sistema tributário eficiente. São partes complementares de uma reforma fiscal, essenciais à efetiva mudança no regime fiscal e monetário.
Cortes lineares de gastos sem novo desenho das funções públicas só reduzem o potencial de crescimento econômico; política monetária sozinha gera apenas inflação. Em ambos os casos, com persistência inflacionária.
Marcos Cintra Cavalcanti de Albuquerque, doutor em Economia pela Universidade de Harvard (EUA).