Embora não se conheça com um mínimo de clareza a política econômica que será adotada pelo governo Itamar Franco, parece que se busca novamente pactuar com uma trajetória inflacionária.
A reativação das câmaras setoriais está sendo cogitada como um dos pilares da nova política anti-inflacionária.
De certa forma, busca-se a reversão da estratégia da equipe econômica anterior, que sustentou firmemente a plena liberdade de mercado, ao menos nas políticas de formação de preços nos mercados privados.
Negociações setoriais de preços já foram tentadas várias vezes no passado. Fracassaram todas.
Em realidade, é difícil imaginar que em uma economia de mercado, como pretende ser a brasileira, segmentos industriais inteiros se reúnam com o intuito de refrear a índole natural dos agentes econômicos de concorrer com seus competidores.
A essência do dinamismo capitalista é a busca do lucro, o açambarcamento de fatias crescentes do mercado e a disputa pela distribuição da renda.
Desacreditado
Por outro lado, uma economia de disparidades tão gritantes na distribuição de renda pessoal, funcional e regional dificilmente pode ser considerada um ambiente favorável a negociações destituídas de características reivindicatórias intensas.
Pode-se acrescentar ainda a ausência de um poder mediador forte, papel que dificilmente poderá ser desempenhado pelo próprio setor público, hoje fortemente desacreditado e enfraquecido pelas dificuldades políticas por que passa.
Redundante
É questionável a eficácia de uma eventual prefixação de preços e salários sem que as reformas estruturais sejam implementadas. As dificuldades na definição dos rumos da reforma tributária, a falta de projetos consistentes de redefinição do papel do Estado na economia, as mazelas da estrutura orçamentária brasileira, a total subordinação das autoridades monetárias ao Executivo e ainda a forte recessão que o setor produtivo enfrenta são obstáculos quase que insuperáveis na sustentação de qualquer acordo pactuado entre trabalhadores, empresários e governo.
Pode-se até aceitar um pacto que busque a queda gradual da inflação, desde que as pré-condições de estabilidade estejam presentes, ainda que ele possa ser redundante.
Mas imaginar uma política de prefixação no caótico quadro atual é sonhar acordado.
MARCOS CINTRA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE, 45, é doutor pela Universidade de Harvard (EUA), professor da Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas, consultor de economia da Folha e presidente regional do PDS.