Desde o início do processo de impeachment contra o ex-presidente Collor, passando pelos trabalhos da CPI do Orçamento, o Brasil presencia um extraordinário movimento destinado a resgatar a ética na política. Entretanto, a corrupção não é o único aspecto a ser avaliado na conduta dos políticos.
Há uma outra questão: quais os limites éticos que um político deve observar na ânsia de obter votos para chegar ao poder? Seria tão grave quanto receber propinas de empreiteiras um político manipular movimentos populares, estimulando o desrespeito às leis e à Justiça, através de confrontos que podem resultar em feridos e mortos?
Aqui é onde políticos que clamam por cadeia para os corruptos sob os refletores das CPIs, praticam atos, protegidos por suas imunidades parlamentares, que não são menos merecedores de cadeia.
Tome-se os episódios recentes da invasão da Assembleia Legislativa de São Paulo pelos professores em greve, da invasão de terras em Getulina, dos incidentes no aterro sanitário de Itatinga em São Paulo e do confronto na favela de Heliópolis.
As reportagens publicadas pela imprensa sobre a "batalha" na favela de Heliópolis revelam a que ponto pode chegar a incitação para a invasão de terras. Felizmente não houve mortes, mas as cenas faziam supor que São Paulo tivesse se transformado em Sarajevo ou na Faixa de Gaza.
Transcrevo trecho de uma matéria: "Uma mesa virou palanque e foi montado equipamento de som com amplificador e microfone. Lideranças comunitárias e parlamentares do PT improvisaram um comício. O vereador Odilon Guedes (PT) pediu votos para 'Lula presidente, porque é o PT que está ao lado do povo'. 'Partido aqui só o dos Trabalhadores', gritava José Mentor, vereador do PT. O deputado estadual Rui Falcão apelava para a 'resistência sempre' em caso de nova tentativa de remoção." Sobre os conflitos entre favelados e moradores de um condomínio vizinho da Cohab, outro jornal relata: "Ainda com a PM no local e mesmo depois de sua retirada, os favelados arrebentaram carros, invadiram apartamentos, jogaram coquetéis molotov e chamavam os condôminos para a briga."
Um cenário de guerra civil, com destruição de propriedade e pessoas feridas. Ódio entre moradores numa guerra que poderia ter sido de morte. Aqui fica a pergunta, até para que as próximas eleições não sejam palco de tragédias: será ético fazer política dessa forma?
MARCOS CINTRA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE, 48, doutor em Economia pela Universidade de Harvard (EUA), é vereador da cidade de São Paulo pelo PL e professor titular da Fundação Getulio Vargas (SP). Foi secretário do Planejamento e de Privatização e Parceria do Município de São Paulo (administração Paulo Maluf).