Ancoras cambiais são instrumentos limitados em economias com baixo coeficiente de abertura. A fixação do câmbio é medida de curto prazo. Com ela, os preços internos caem, a oferta de importados torna-se farta, o PIB e o poder de compra crescem, produtos sofisticados aparecem no mercado. México, Argentina e Brasil caminharam na estabilização, ancorados no câmbio. Porém, ao não complementarem a política cambial com alterações nos regimes monetário e fiscal, deixaram de lado os fundamentos da estabilidade econômica. Diferentemente do México, o Brasil não acumulou déficit comercial de US$ 18 bilhões nem perdeu 75% de suas reservas, enquanto naquele país as reservas desabaram em poucos dias, de US$ 24 bilhões para US$ 6,5 bilhões.
Acrescente-se a isso o fato de o governo brasileiro ter controlado o componente inercial da inflação, colhendo como resultado o aumento de preços de 2% ao mês, expansão da demanda e do emprego. Mas quem arca com os custos desse resultado? Os lucros e os salários dos setores de bens comercializáveis, exportadores e setores que competem com produtos importados. Entretanto, começam a surgir problemas — haverá déficit comercial de cerca de US$ 250 milhões por meses seguidos, o fluxo financeiro será também negativo, e já começarão as perdas de reservas?
Ademais, a inflação nos setores não comercializáveis e nos serviços já rola livre entre 5% e 10% ao mês. Assim, a frágil âncora cambial poderá ser arrastada pelas correntezas dos desajustes estruturais da economia brasileira. As correções implicam reformas, como a tributária, a administrativa e a previdenciária, com o que se estaria passando o custo da arrumação para os que se locupletam com os desajustes do sistema — os beneficiários da corrupção e dos privilégios do setor público. Na ausência das reformas, estaremos sujeitos a viver experiências dolorosas, como as do México e da Argentina.
Marcos Cintra é doutor em Economia pela Universidade de Harvard.