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Marcos Cintra - Gazeta Mercantil

Proposta de reforma tributária, méritos e defeitos

O governo apresentou, ainda que de forma preliminar, uma segunda proposta "oficial" de reforma tributária que não altera a estrutura de impostos no Brasil. Permanece o atual sistema clássico, baseado em impostos declaratórios. Mudam-se as atribuições e competências dos entes federados e eliminam-se alguns penduricalhos, como o Cofins e os adicionais sobre o lucro.


Duas novidades merecem destaque: a unificação do IPI, do ICMS e do ISS em um IVA federal e a criação, no âmbito das atribuições de estados e municípios, de um imposto unifásico de varejo, semelhante ao cobrado nos Estados Unidos. Nesse modelo, o comerciante varejista adiciona o imposto ao preço final de seus produtos ou serviços, enquanto a produção e o atacado não são tributados por esse imposto. Os estados cobrariam esse tributo sobre as vendas a varejo de produtos manufaturados, e os municípios, sobre serviços.


Como avaliar essa proposta? Uma primeira característica a ser notada é o aprofundamento da centralização tributária já existente no Brasil. A proposta acentua essa característica, o que pode intensificar os conflitos na transferência de recursos e afetar as relações políticas entre as três esferas de governo.


É importante esclarecer que a crítica não sugere que a proposta seja uma ameaça à Federação, como alguns defensores do governo alegam. No contexto brasileiro, onde o governo central arrecada 67% da carga tributária bruta, enquanto os estados ficam com 28% e os municípios apenas 5%, é irônico falar em ameaça à Federação. Economicamente, o Brasil já se assemelha mais aos sistemas unitários europeus do que a uma verdadeira federação, como os Estados Unidos.


Os dados mostram que a autonomia econômica dos estados e municípios é limitada. A relação entre arrecadação líquida e recursos disponíveis demonstra que a União arrecada cerca de 20% a mais do que gasta, transferindo essa diferença para os níveis inferiores da administração. Por outro lado, os municípios arrecadam apenas cerca de 30% do necessário para suas despesas, dependendo dos estados e da União para sobreviverem.


É importante observar que os estados arrecadam cerca de 5% a mais do que gastam, mas ainda dependem da União, da mesma forma que os municípios dependem deles. Uma boa reforma tributária deveria contribuir para reverter a centralização tributária atual, garantindo maior aderência do sistema econômico ao regime político federativo já consolidado no país.


No entanto, a proposta do governo caminha na direção oposta, exacerba o conflito entre a descentralização e a autonomia políticas e a concentração e dependência tributárias, aumentando a subordinação econômica de governadores e prefeitos ao governo federal.


Por outro lado, a administração do novo IVA poderia ser aprimorada, uma vez que impostos sobre valor agregado enfrentam desafios operacionais em sistemas federativos. O Brasil é um dos poucos países que têm um IVA estadual, o que gera complexidade administrativa, embora seja uma fonte primordial de recursos para os estados.


A profunda centralização proposta poderia ser vista de outra perspectiva: a unificação do ICMS, do IPI e do ISS resultaria em um IVA com alíquotas elevadas, para evitar perda de arrecadação e compensar estados e municípios pela perda desses importantes tributos. No entanto, isso também poderia estimular a evasão fiscal, dada a elevação das alíquotas, agravando os problemas operacionais do sistema tributário brasileiro, como a sonegação e a economia informal.


Além disso, a nova proposta pressupõe uma ética tributária que não existe no Brasil, especialmente ao tentar arrecadar impostos em cada ponto de varejo. Os custos administrativos seriam enormes, incluindo a necessidade de sistemas de fiscalização mais pesados.


Em resumo, a nova proposta é centralizadora, burocrática e provavelmente aumentaria a evasão fiscal. Seguir por esse caminho resultaria em uma ditadura burocrática e na expansão da economia informal, prejudicando a equidade e a eficiência do sistema tributário brasileiro.





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