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Marcos Cintra - Revista Conjuntura Econômica

As lições do México

O caso do México é frequentemente trazido à tona nos debates da Alca. Curiosamente, tanto opositores quanto defensores da Alca exibem argumentos a favor de suas posições esgrimindo, ambos os lados, estatísticas sobre o desempenho da economia mexicana após sua adesão ao Nafta em 1994.


Os dados, contudo, aparentam mostrar que a estratégia de integração foi altamente favorável à economia mexicana, ainda que nos dois últimos anos o ímpeto expansionista venha perdendo força dada a ausência de mecanismos mais eficientes de "internalização" dos benefícios potenciais do Nafta.


Vários indicadores apontam o sucesso da estratégia de crescimento do México após sua adesão ao Nafta. Em 2000, o país cresceu 6,9%, com taxa de inflação de 9,5%. Entre 1996 e 2000, a taxa média de crescimento do PIB foi de 3,9% ao ano. Após uma retração de 0,3% em 2001, devido aos problemas na economia americana, o crescimento previsto para 2002 é de 1,7%. Sua carga tributária é de 14% do PIB, excluindo a arrecadação vinculada ao petróleo, tornando-se inferior a 10% do PIB.


Claramente, o país orientou sua economia para o exterior, registrando uma taxa de crescimento no comércio internacional, entre 1990 e 2000, de 15,3% ao ano, equivalente à China, com 15,2%, enquanto a América Latina, excluindo o México, alcançou apenas 7,6%. Assim, tornou-se a oitava economia exportadora do mundo, embora com elevado grau de concentração - 90% de suas transações comerciais são com os Estados Unidos. Esses indicadores mostram uma economia que claramente passou por um ponto de inflexão após a adesão ao Nafta, demonstrando sinais evidentes de maior dinamismo.


O México se tornou uma grande potência comercial, com um comércio de US$ 350 bilhões. Sua presença no comércio mundial saltou de 0,89% em 1980 para 2,43% em 1999. Com isso, a participação das exportações no PIB passou de 7,6% em 1980 para 14% em 1994 e chegou a 32% em 1999.


Os salários reais no setor exportador aumentaram 37% em relação à média da economia, e o país mantém um saldo comercial positivo com seu vizinho do Norte. Entre 1996 e 2000, foram criados em média 800 mil novos postos de trabalho por ano. Estima-se que metade dos novos empregos industriais gerados nos últimos anos esteja ligada ao incremento do setor exportador. A produtividade da mão de obra industrial e os salários aumentaram cerca de 25% entre 1995 e 2000.


Cumpre lembrar que o México mantém, desde 2000, um tratado de livre-comércio com a União Europeia e acordos semelhantes de tarifas preferenciais com 32 países, entre os quais o Brasil, englobando 850 milhões de consumidores. As exigências de nacionalização das exportações em todos os tratados de livre-comércio (regras de origem) fizeram com que o grau de nacionalização nas "maquilladoras" seja de 23,7%, pouco abaixo do percentual das exportações em geral, que é de 30,4%. O México é o maior exportador de produtos manufaturados da América Latina.


Tecnologicamente, o México deu um salto de qualidade, atraindo tecnologia e know-how por meio dos investimentos das empresas americanas de alta tecnologia e dos acordos de transferência de tecnologia e de produção local efetuados.


Contudo, tais resultados são questionados. Em primeiro lugar, por não gerarem os benefícios esperados para as camadas populacionais e para as regiões mais pobres. Houve uma relativa informalização das relações de trabalho, embora não se consiga provar a vinculação direta pelo fato de aderir ao Nafta. Grande parte do setor produtivo mexicano foi desnacionalizada, e alguns segmentos industriais, tais como o de metalurgia básica, simplesmente sucumbiram frente às importações americanas. Teme-se que o mesmo venha a ocorrer com a agricultura, devido ao aprofundamento da abertura previsto para 2003.


O mais preocupante, contudo, é que a economia mexicana não se mostrou capaz de criar um mercado interno forte para sustentar o incremento da produção interna, ficando excessivamente dependente das exportações. Além disso, a absorção de tecnologia não foi autonomizada, e muito menos se conseguiu efetuar uma transição de "competitividade de custos", característica da primeira fase da integração por meio de custos salariais baixos, para a "competitividade tecnológica", mais sólida e duradoura. É importante apontar que os custos salariais mexicanos começam a perder suas expressivas vantagens, o que vem gerando temores de que as "maquilladoras" possam se retirar do México em direção a países como China ou Vietnã.


Outra crítica se refere à incapacidade do governo mexicano de aumentar a carga tributária bruta, a fim de permitir que o Estado possa criar mecanismos de assistência aos setores populacionais e às regiões mais pobres do país.


Em resumo, o México é um bom exemplo para o Brasil lidar com a Alca. A integração é um fato que o país precisa assimilar de modo decisivo, e a experiência mexicana no Nafta é uma oportunidade para o governo brasileiro encaminhar suas ações, evitando, com isso, os erros cometidos por lá.



Marcos Cintra Cavalcanti de Albuquerque, 57, é doutor em Economia pela Universidade de Harvard (EUA) e professor-titular e vice-presidente da Fundação Getulio Vargas. É autor do livro "A verdade sobre o Imposto Único", Editora LCTE, SP, 2003.

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