A atividade produtiva brasileira apresenta uma característica peculiar: é marcada por episódios de expansão seguidos de retração, como ilustrado no gráfico desta página. O crescimento atual, embora não seja tão robusto quanto se afirma, pois se baseia em um desempenho medíocre de 2003, parece ser mais um episódio de crescimento de curto prazo.
Os dados mais recentes da conjuntura atual revelam algumas características interessantes.
Em primeiro lugar, o atual surto de crescimento é impulsionado principalmente pelas exportações, embora alguns indicadores já mostrem que a expansão dos setores exportadores começa a impactar positivamente o potencial consumidor do mercado interno.
Se o dinamismo do setor externo não se refletir no mercado interno, o país permanecerá dependente da conjuntura internacional, sobre a qual não possui controle. Isso relegaria em segundo plano o maior potencial da economia brasileira, que é o seu mercado interno.
Em segundo lugar, esse curto período de expansão, que ainda não completou um ano, já esgotou praticamente a capacidade produtiva de alguns setores. Já existem gargalos em segmentos como o fornecimento de autopeças e aço, e em breve eles também surgirão em setores estratégicos, como energia elétrica, logística de transportes, armazenamento e capacidade portuária.
Em terceiro lugar, é possível observar que os investimentos no Brasil ainda são fortemente desestimulados pelo sistema tributário e pelo custo do capital. Em outras palavras, a falta de condições que incentivem a formação de capital é uma ameaça constante ao crescimento econômico de médio e longo prazo. Dados da Anefac mostram que as empresas enfrentam taxas de juros anuais médias de 63% para capital de giro, 58% para desconto de duplicatas, 60% para desconto de cheques e 100% para conta garantida.
Nesse sentido, é crucial apontar que o alto custo do capital é o principal obstáculo a ser superado para garantir um processo de crescimento auto-sustentado. Não se trata apenas da falta de uma política industrial ou de planejamento insuficiente. Esses fatores também têm sua importância, mas a maior carência reside na ausência de condições microeconômicas que facilitem o funcionamento da economia e permitam uma expansão viável e duradoura.
Se o governo, até o momento, tem obtido realizações significativas em termos macroeconômicos, falta agora dar continuidade a essas realizações com medidas microeconômicas sólidas. Sem uma política interna consistente de crescimento, a atual política de restrições monetárias e fiscais continuará. O risco é que as demandas impostas à sociedade brasileira se tornem insustentáveis, ameaçando sua estabilidade social.
Reduzir o custo do capital e incentivar o crescimento da capacidade produtiva é uma tarefa primordial. O país continua sob influência do setor bancário e financeiro, que impõe spreads bancários excessivamente altos sobre a taxa de juros básica. As altas taxas de juros comprometem a capacidade produtiva nacional, geram concentração de renda e desemprego.
Quando o Copom mantém a taxa Selic em níveis elevados, o faz para preservar as condições macroeconômicas conquistadas nos últimos anos, ou seja, para manter a integridade do "triângulo intocável" formado pelo controle da inflação, contenção do crescimento da dívida pública e equilíbrio nas contas externas. Esses resultados não podem ser postos em risco.
Uma pergunta pertinente é feita por Maria Clara do Prado em sua coluna recente: "Por que o Brasil não consegue crescer um milímetro sem o risco da volta da inflação?". Essa pergunta é também uma resposta para aqueles que tentam entender o excessivo conservadorismo do Banco Central, que insiste em manter a taxa de juros básica da economia em níveis elevados. A taxa Selic é a única âncora disponível, e soltá-la poderia levar a economia a descontrolar-se.
Por outro lado, se os spreads bancários fossem razoáveis, como em outros países, a taxa de juros ao tomador não ultrapassaria 25% ou 30% ao ano, em vez das taxas exorbitantes de 70% para empresas e 140% para pessoas físicas. Juros mais razoáveis permitiriam financiar investimentos produtivos e quebrar a corrente entre crescimento e inflação.
O governo já conquistou condições macroeconômicas adequadas. Agora, deve aproveitar esse impulso para iniciar reformas microeconômicas, como a reforma tributária, previdenciária, política, agrária, do Judiciário e outras. Sem uma sequência sólida de políticas institucionais internas de crescimento, o país corre o risco de continuar experimentando apenas breves surtos de crescimento.
Marcos Cintra Cavalcanti de Albuquerque, 58 anos, doutor pela Universidade Harvard, professor titular e vice-presidente da FGV, foi deputado federal (1999-2003). Atualmente é secretário das Finanças de São Bernardo do Campo. É autor de "A verdade sobre o Imposto Único" (LCTE, 2003). Escreve às segundas-feiras, a cada 15 dias, nesta coluna. Internet: www.marcoscintra.org E-mail: mcintra@marcoscintra.org.