Em entrevista publicada em 13 de agosto último no caderno Dinheiro da Folha, o fundador do banco Itaú, Olavo Setubal, afirmou: "Lula ou Alckmin é a mesma coisa. Os dois são conservadores". Nenhum dos dois candidatos gostou da declaração, mas o entrevistado está coberto de razão, ao menos no que diz respeito às respectivas propostas tributárias. No dia 16 de agosto, Geraldo Alckmin participou do ciclo de entrevistas no jornal "O Estado de S.Paulo" e afirmou que pretende criar o IVA, que seria cobrado no local de consumo. Da mesma forma, o governo do PT, logo que assumiu, anunciou que pretendia criar o IVA em 2007. Essa diretriz não foi adiante, mas continua nos planos do presidente Lula. Ao discursar para os integrantes do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, ele afirmou: "Temos que caminhar para a simplificação com um único imposto de valor agregado". Como se vê, as propostas de reforma tributária de Lula e de Alckmin são iguais e equivocadas. Ambos defendem um projeto arcaico que aprofundará as mazelas provocadas pela carcomida estrutura de impostos brasileira. Talvez o único mérito desse projeto seja a eventual simplificação de um sistema caótico. O ICMS, por exemplo, conta hoje com 27 legislações e uma infinidade de alíquotas nominais e efetivas. O PIS e a Cofins não-cumulativos revelou-se um pandemônio incompreensível e sem nenhuma racionalidade. A incorporação de todos esses tributos em um IVA nacional seria, sob esse aspecto, bem-vindo. Contudo o grande erro do IVA único é que o sistema continuaria sendo declaratório e exigiria uma alíquota elevada para garantir a arrecadação esperada. Será como jogar lenha na fogueira da sonegação. Além disso, é sempre oportuno lembrar a experiência internacional. O IVA vem sendo colocado na alça de tiro dos reformadores europeus. A unificação dos mercados naquele continente desencadeou uma série de fraudes fiscais que comprometem a eficácia do modelo. A proposta apresentada pelo comissário europeu de Assuntos Fiscais, Lazsló Kovács, para enfrentar o problema é a cobrança do IVA no país de origem em substituição à incidência no consumo, justamente o contrário do que estão propondo Lula e Alckmin. Cabe apontar que ambos aderiram ao modelo tributário europeu, ignorando a experiência dos norte-americanos, que, da mesma forma que o Brasil, é uma nação federativa e, portanto, estruturalmente incompatível com um tributo sobre o valor agregado como o IVA, mormente se de competência subnacional. Ademais, o IVA no destino, a federalização de sua legislação e a unificação de suas alíquotas não tornarão o sistema simples (no sentido de reduzir custos administrativos para o governo e para o setor privado) nem eficaz (no tocante ao combate à evasão e à sonegação). Pelo contrário, a estrutura se tornará mais complexa, mais cara e mais suscetível a fraudes. A adoção do IVA, como querem Lula e Alckmin, será mais uma frustração tributária para o país, que demanda uma reforma estrutural, e não só, como afirmou Roberto Campos, "um esforço inútil de aperfeiçoamento do obsoleto". É lamentável ver que num momento marcante da história do país os dois candidatos à Presidência não têm um projeto tributário inovador capaz de alavancar o crescimento econômico e ao mesmo tempo simplificar, combater a evasão, reduzir a carga individual de impostos e equacionar os conflitos federativos. Essas diretrizes somente serão atendidas por um sistema tributário que adote a movimentação financeira como base de incidência. A partilha seria automática entre os níveis de governo e a arrecadação incidiria sobre uma base ampla. A alíquota desse imposto seria baixa, e a sonegação, remota. A redução de custo tributário teria forte impacto positivo sobre a competitividade da economia. É preciso uma revolução tributária para colocar o país na rota do crescimento. Infelizmente, nem Lula nem Alckmin se deram conta disso.
MARCOS CINTRA, doutor em economia pela Universidade Harvard (EUA), e professor titular da Fundação Getulio Vargas.