Projeções apontam que o índice médio de desemprego medido pelo IBGE pode ficar na casa de 9% em 2009, o que significaria um contingente de quase 2,2 milhões de desempregados nas áreas metropolitanas pesquisadas, contra os atuais 1,8 milhão.
Era de se esperar que a crise trouxesse consequências negativas em setores mais inseridos no cenário externo. Era previsível que a redução em linhas de crédito internacional e nos preços e quantidades demandadas de bens exportáveis gerassem a necessidade de ajustes na produção, com consequências sobre o mercado de trabalho. No entanto, a turbulência está atingindo uma dimensão maior do que o esperado na economia brasileira, devido à expectativa negativa que vem sendo criada. O ambiente torna-se cada dia pior, impactando fortemente o mercado de trabalho.
Este mercado virou refém de uma onda catastrófica que se realimenta e gera ações defensivas por parte do empresariado. A percepção de que a crise vai se acentuar leva o empresário a projetar cortes de pessoal para se ajustar ao cenário negativo.
Há uma alternativa que poderia distribuir melhor o impacto da crise sobre o setor produtivo. Empresas, utilizando uma estratégia financeira devidamente comprovada, poderiam negociar com o sindicato da categoria profissional a diminuição de salários de seus empregados por tempo determinado.
Certamente, haveria um consenso entre os trabalhadores, que prefeririam manter seus empregos, mesmo que recebendo menos, do que permanecer desempregados e ter que conviver com rendimento zero. Além disso, mesmo que encontrem outro trabalho, numa situação de crise, a remuneração para o mesmo cargo tende a ser menor.
A proposta seria uma medida eficaz para preservar empregos em massa, contribuindo para reverter o ambiente negativo que se instalou no país. Em vez de simplesmente cortar postos de trabalho, prejudicando em maior grau os trabalhadores, as empresas poderiam negociar com os sindicatos uma redução nos salários na proporção das pretendidas demissões. Se uma empresa concluísse que teria que reduzir 5% de sua folha salarial, por exemplo, essa queda se daria não com cortes de funcionários, mas através da diminuição dos salários.
A Constituição Federal, em seu artigo 7°, inciso VI, prevê a possibilidade de redução salarial mediante convenção ou acordo coletivo. A diminuição dos salários deve ocorrer em comum acordo com os sindicatos dos trabalhadores. Para tornar a proposta mais palatável, a revisão nos valores poderia ocorrer em função dos cargos na empresa, ou seja, haveria maiores reduções para os escalões mais elevados, enquanto os salários mais baixos teriam cortes menores.
Mesmo que a legislação dificulte a redução de salários, essa proposta poderia ser discutida e viabilizada através de mudanças temporárias em leis específicas que regem a questão. Assim, a empresa que estiver enfrentando dificuldades financeiras, devidamente comprovadas, poderia negociar com os sindicatos uma redução temporária nos salários como medida para preservar empregos.
É preciso desfazer a onda negativa criada em função da crise econômica mundial, que está prejudicando os trabalhadores. A alternativa de reduzir salários como forma de evitar demissões seria um modo criativo de reverter a situação e manter o desempenho positivo ocorrido no mercado de trabalho nos últimos anos.
Marcos Cintra, doutor em Economia pela Universidade Harvard (EUA), professor titular e vice-presidente da Fundação Getúlio Vargas.