Uma das dificuldades encontradas em planos de estabilização é o conflito entre eventuais perdedores e ganhadores. Vive-se isso hoje. Assalariados alegam estar perdendo poder aquisitivo. As negociações entre fornecedores, industriais e comerciantes continuam tumultuadas, reduzindo o ritmo de adesão à URV. Assim, a queda abrupta da inflação, prevista para após a criação do real, precisa ser acompanhada de um acordo social para evitar que setores, na defesa de seus interesses, apostem contra a estabilidade. Infelizmente, a compreensão do que representa este pacto difere radicalmente dependendo do ator no cenário econômico. Para o governo, este entendimento significa maior arrecadação de impostos; para o trabalhador, mais salário; e, claro, o empresário, mais lucros. Como compatibilizar esses interesses? O Imposto Único pode ser uma saída. O custo da mão-de-obra para o empregador é o dobro do salário pago ao trabalhador. Se o custo a ser eliminado com o Imposto Único fosse absorvido inteiramente pelos salários, poderia representar um acréscimo real de até 66% sobre os rendimentos líquidos atuais.
Além disso, a queda nos custos de produção seria significativa, com a eliminação das obrigações acessórias tributárias — escrituração fiscal, emissão de notas fiscais, preenchimento de guias, livros etc. Em suma, o Imposto Único abre ampla margem de manobra e negociação dentro de um novo perfil de distribuição de renda gerado pela estabilidade monetária. Abre espaço para recomposição salarial sem aumento do custo do trabalho, para queda no preço sem redução de margens e para maior remuneração a fatores sem queda de arrecadação pública. Cabe apontar ainda que o Imposto Único poderia ser implementado dentro do atual quadro institucional. Alguns impostos poderiam ser eliminados já, como o Cofins e adicionais do Imposto de Renda. Concomitantemente, se ampliaria a alíquota do IPMF e se concederia descontos sobre as datas de recolhimento dos demais impostos, para evitar aumentos da carga tributária.
MARCOS CINTRA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE, 48 anos, é doutor em Economia pela Universidade de Harvard (EUA). É vereador da cidade de São Paulo pelo PL e professor titular da FGV (SP). Foi secretário do Planejamento e de Privatização e Parceria do Município de São Paulo na administração Paulo Maluf.