Em um artigo publicado no jornal O Globo, Everardo Maciel, ex-Secretário da Receita Federal, abordou um aspecto fundamental relacionado ao caos tributário vigente no país. No texto intitulado "Os Nós Tributários," publicado em 4 de maio último, o autor apresenta dados decorrentes da complexa legislação fiscal e tributária no Brasil. Em um trecho do artigo, Everardo Maciel afirma que "os créditos inscritos na Dívida Ativa da União totalizam R$ 1,5 trilhão; cerca de R$ 620 bilhões e R$ 330 bilhões de créditos, relativos a tributos federais, estão em discussão na esfera administrativa e judicial, respectivamente; 60% dos litígios judiciais estão relacionados à matéria tributária; em 2014, quase a metade das maiores empresas (35 maiores companhias abertas) recorrem a parcelamentos de tributos, muitas vezes associados a lamentáveis anistias e remissões; ainda em 2014, o valor das disputas fiscais das 30 maiores empresas de capital aberto corresponde a 32% do respectivo valor de mercado."
O autor continua afirmando que "no final de 2015, tramitavam 73,9 milhões de processos na Justiça, dos quais 28,9 milhões (39,1% do total) eram de execução fiscal. Apenas como exercício estatístico, observe-se que, caso não ingressassem novos processos de execução fiscal (hipótese heróica) e fosse mantido o vigente ritmo de execução de sentenças (hipótese razoável), a Justiça levaria mais de 11 anos para liquidar o atual estoque." Everardo Maciel conclui esta parte do artigo afirmando: "Parece evidente que existe algo muito errado em tudo isso. A excessiva litigiosidade escandaliza os investidores estrangeiros. A morosidade processual e a expectativa de um parcelamento generoso favorecem os litigantes. A ineficiência do processo explica, em parte, o tamanho da carga tributária."
O texto de Everardo Maciel dá uma ideia dos efeitos da burocracia tributária no país. É impressionante como as regras nessa área proliferam no Brasil. São ações insanas que criam uma estrutura cada vez mais complexa, impossível de ser compreendida, gerando custos para as empresas e tornando o sistema cada vez mais vulnerável à corrupção e um gerador de litígios em todos os níveis de governo. Na questão tributária, o país precisa mudar paradigmas em vez de aprofundar seus defeitos, como a burocracia pública insiste em fazer. O potencial da economia brasileira é difícil de ser alcançado, e isso, em grande parte, decorre de uma visão que rejeita o simples e abraça o complexo.
Os dados apresentados por Everardo Maciel são alarmantes. O sistema que gera essas aberrações custa muito caro para a economia do país. Recursos são desperdiçados pelas empresas e pelas pessoas físicas devido às inúmeras disputas judiciais. Há também perdas governamentais devido aos gastos envolvendo a máquina pública responsável pelo controle e fiscalização dos tributos. Apenas uma reforma profunda e ampla do sistema tributário, nos moldes do Imposto Único, é capaz de lidar com a avalanche de litígios que ocorre atualmente. Simplificar a estrutura de arrecadação e eliminar o modelo declaratório de impostos são diretrizes que devem orientar esse processo.
Marcos Cintra é doutor em Economia pela Universidade Harvard (EUA), professor titular da Fundação Getulio Vargas e autor do projeto do Imposto Único. Atualmente, é Presidente da Finep (Financiadora de Estudos e Projetos).
Publicado no Jornal Perfil Econômico: 16/05/2017