Marcos Cintra vê 2022 polarizado entre “extrema-direita” de Bolsonaro e “esquerda populista” de Lula
Ex-secretário da Receita Federal diz que não repetiria voto em Bolsonaro e prefere nome de centro para as próximas eleições
por Thales Schmidt
Marcos Cintra faz autocrítica. O economista, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e ex-membro do time econômico de Jair Bolsonaro (sem partido) acredita que não levou em conta os “empecilhos e interesses” envolvidos na implantação de um imposto único no Brasil, bandeira que defende desde a década de 1990.
“Um dos impactos maiores que eu tive após uma autocrítica que demorou 20 anos para ser feita. Eu chego à conclusão de que não é fácil você agredir o pacto federativo brasileiro”, afirma Cintra ao MyNews. “Isso é uma mudança que não vai ocorrer no Brasil, na minha avaliação agora, depois dessa autocrítica, com muita facilidade”.
Isso não significa que o economista abandonou o assunto. Para ele, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 45, de autoria do deputado federal Baleia Rossi (MDB-SP), é uma peça “ingênua” e “idealista”. A PEC 45 prevê a unificação de cinco impostos: IPI, PIS, Confins, ICMS e ISS em um novo tributo, o Imposto Sobre Bens e Serviços (IBS).
O então secretário da Receita Marcos Cintra em evento, em 2019. Foto: José Cruz/Agência Brasil“Ela [PEC 45] só ganhou esse protagonismo todo porque, por alguma razão, o [então] presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), encasquetou que era a única possível, era a quintessência da modernidade. Não é verdade.”
Agora com a Câmara sob o comando de Arthur Lira (PP-AL), Cintra avalia que o debate sobre a reforma tributária deverá ser pautado pela PEC 110 e o projeto de lei do Simplifica já.
Com a pandemia de covid-19, os governos estão aumentando seus gastos. Diante do crescimento das despesas estatais, dois países resolveram aumentar a conta dos mais ricos.
Na Argentina, foi aprovado um imposto chamado de Aporte Solidário e Extraordinário. A medida prevê uma cobrança única de 2% a 5,25% para quem tiver patrimônio superior a 200 milhões de pesos argentinos, cerca de R$ 12,5 milhões. A expectativa é que entre 9 e 12 mil pessoas sejam impactadas.
Já na Bolívia, foi criado um imposto para quem tiver patrimônio superior a 30 milhões de bolivianos, cerca de R$ 25 milhões. A alíquota varia entre 1,4% a 2,4% e a cobrança será anual.
“Eu não sou favorável a nenhum aumento de carga tributária. Nenhum. Seja sobre grandes fortunas, seja sobre lucro das empresas, seja sobre profissionais autônomos. Por quê? Porque nós já temos uma carga tributária absolutamente confiscatória”, afirma.
Cintra acredita que a atual carga tributária do Brasil já “inviabiliza” o país e que a arrecadação pode aumentar por meio da cobrança de setores que não contribuem, como sonegadores e informais. Para ele, o caminho é a redução do tamanho do Estado.
“Nós temos que abrir a economia para os setores privados entrarem e suprirem as necessidades de infraestrutura e tudo mais. Veja, os capitais privados estão desejosos, porque a liquidez do mundo é gigantesca, de encontrar oportunidades de investimento. O Brasil é um dos países com mais oportunidades de investimento porque é um país gigantesco, 250 milhões de consumidores, não temos problemas raciais, culturais”. Antes de colaborar com o plano econômico de Bolsonaro e ser o secretário da Receita Federal em 2019, Cintra disputou eleições e ocupou cargos políticos. O economista foi vereador em São Paulo entre 1993 e 1996 e deputado federal entre 1999 e 2003, com a bandeira do Partido Liberal (PL). O professor universitário também foi secretário do Planejamento e de Privatização e Parceria na gestão de Paulo Maluf na Prefeitura de São Paulo, em 1993.
Cintra acredita que as próximas eleições presidenciais terão uma “mudança muito intensa”. Eleitor de Bolsonaro no primeiro e no segundo turno de 2018, o economista não pretende repetir seu voto e diz optar por um nome de centro em sua próxima visita à urna eletrônica.
“Eu acho que o pêndulo político vai sofrer uma mudança muito intensa. Não se esqueça que em 2018 eu votei em Bolsonaro porque houve um plebiscito entre PT e Bolsonaro. E eu, evidentemente, preferi e votei no Bolsonaro até porque ele endossou a política liberal, moderna, o social liberalismo no qual eu acredito. Agora, eu acho que o espectro político vai ser muito diferente. Nós vamos ter a extrema-direita, ou o populismo de direita, que vai continuar sendo o governo Bolsonaro, nós temos a esquerda também populista que é o presidente Lula, mas eu vejo surgindo quase como uma necessidade histórica um grupo de centro.”
O professor da FGV avalia que “não foi sincero” o compromisso de Bolsonaro com o liberalismo e diz lamentar que a reeleição tenha sido uma preocupação do governo desde o primeiro mês de gestão, apesar de Bolsonaro ter afirmado em 2018 que seria contra a recondução do presidente ao cargo para mais um mandato.
“O presidente Bolsonaro não é um liberal que nós achamos que ele poderia ser. Quando ele deu carta branca ao ministro Paulo Guedes, que reuniu uma equipe de liberais, como eu, para fazer um plano de governo e compor o governo, esperávamos que ele fosse endossar medidas até impopulares e difíceis”, diz Cintra.
Créditos: Canal MyNews