MARCOS CINTRA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE Consultor econômico da Folha
Política Habitacional no Regime Militar - Ermínia Maricato. Vozes.
Comentar a política habitacional brasileira nas últimas décadas é sobretudo um ritual de exorcismo. Os erros e abusos foram de tal ordem que qualquer reavaliação dos resultados obtidos induz, inevitavelmente, a uma lista de recomendações sobre o que não fazer se o desejo é recuperar a eficácia de um conjunto de instrumentos que, em tese, poderia resultar numa eficaz política social.
Em "Política Habitacional no Regime Militar", baseado na tese de doutoramento da autora, Ermínia Maricato faz uma nova incursão no assunto. De certa forma, não apresenta fatos novos, além dos que já têm sido bastante discutidos na literatura. Contudo, avança no sentido de tentar identificar grupos de pressão que, de uma forma ou outra, foram responsáveis pela frustração daquela política, e que, segundo a autora, geraram dois espaços distintos no panorama urbano brasileiro: o da "acumulação" e o da "miséria".
Contrapondo a classe trabalhadora a seus "inimigos específicos, os proprietários de terra, a indústria de construção e o capital imobiliário", a autora apresenta o Estado como uma entidade que foi usada pelos grupos de maior poder. Neste sentido, chega perto de isentar o governo de responsabilidade ou, ao menos, lhe ameniza a culpa por decisões simplesmente erradas que foram tomadas.
O texto é polêmico em vários pontos, principalmente ao atribuir à autoconstrução um artifício, objetivando o aviltamento do valor da força de trabalho. Nota-se, ainda, que os dados apresentados chegam apenas até os primeiros anos da década, e que faltam considerações concretas sobre como reformular a política habitacional no Brasil. Não obstante, trata-se de mais uma importante contribuição para o estudo do assunto, como de resto têm sido todos os demais trabalhos da autora.
MARCOS CINTRA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE, 41, doutor em Economia pela Universidade de Harvard (EUA), é diretor da Fundação Getulio Vargas (SP).