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  • Marcos Cintra - Folha de S.Paulo

Cepal versus tigres asiáticos (2/4)

A enorme diversidade nas estruturas econômicas dos países do Terceiro Mundo dificulta qualquer raciocínio unificado sobre as condições necessárias para o desenvolvimento. No entanto, há um condicionante fundamental para o crescimento de todas as nações subdesenvolvidas. Neste segundo artigo sobre modelos de desenvolvimento, abordaremos o impacto das economias industrializadas nos países pobres.


O que esperar dos países desenvolvidos


O PIB das economias desenvolvidas, excluindo a União Soviética e alguns outros países socialistas, equivale a cerca de quatro vezes o valor total do PIB das nações em desenvolvimento - cerca de US$ 2.500 bilhões contra US$ 10.000 bilhões. Com tamanha importância na geração global de bens e serviços, as políticas econômicas adotadas nos países industrializados tornam-se fundamentais para o crescimento dos países pobres.


A inter-relação entre desenvolvidos e subdesenvolvidos ocorre por meio de dois canais principais - comércio internacional e poupança externa. Na medida em que a evolução destes dois fluxos dependa do crescimento econômico nos países ricos, também o desenvolvimento econômico nos países pobres estará intimamente ligado à performance das principais economias da Europa, do Japão e dos EUA. Neste sentido, a manutenção do crescimento econômico das economias industrializadas de alta renda é condição necessária para qualquer esforço de intensificação do crescimento econômico nas nações em desenvolvimento.


Entre 1965 e 1973, a média anual de crescimento dos países industrializados de mercado foi de 4,7% ao ano; entre 1973 e 1980 caiu para 2,8%. Em 1984 houve uma expansão de 4,6%, mas logo em seguida retornou ao padrão dos últimos 15 anos, de 2,8% em 1985 e 2,5% em 1986. Neste período, também a taxa média de crescimento anual dos países do Terceiro Mundo caiu de 6,5% entre 1965 e 1973 para 5,4% entre 1973 e 1980. Em 1984 o crescimento médio atingiu 5,1%, caindo em 1985 e 1986 para 4,8% e 4,2%. Nota-se assim uma forte correlação nas tendências de crescimento, evidenciando as ligações existentes entre as economias ricas e pobres do mundo.


Aproximadamente dois terços das exportações dos países em desenvolvimento vão para as economias industrializadas, ao passo que cerca de 70% das exportações dos países ricos vão para eles próprios. A assimetria é evidente. Os países em desenvolvimento dependem essencialmente das importações dos países industrializados, enquanto estes últimos embarcam apenas cerca de 25% do total de suas exportações para os países pobres.


A partir de meados da década de 70, houve um enorme retrocesso na tendência mundial de liberalização do comércio internacional iniciada após a 2a Guerra Mundial. Os acordos internacionais de redução tarifária não abrangeram produtos agrícolas e bens industriais exportados pelos países em desenvolvimento com a mesma intensidade com que atingiram a pauta de exportações dos países industrializados. E a recessão mundial de 1974-75 iniciou uma nova onda protecionista nos países industrializados, implicando o uso de novos instrumentos como controles de preços, controles de qualidade, limitações "voluntárias" e outros tipos de restrições.


O importante a ser enfatizado, contudo, é que este movimento neo-protecionista atingiu mais fortemente os países em desenvolvimento e particularmente a América Latina. Em 1984 quase 21% das importações dos países industrializados oriundas de países do Terceiro Mundo estavam sujeitas a restrições não-tarifárias, contra apenas 11,3% dos produtos dos países ricos.


Há algumas exigências básicas para que o crescimento econômico nos países pobres possa ser sustentado:

a) um crescimento médio nas economias industrializadas de pelo menos 3% ao ano;

b) maior abertura nos mercados dos países industrializados para mercadorias dos países em desenvolvimento, principalmente pela redução do protecionismo, velado ou explícito;

c) maior estabilidade nas taxas de câmbio das moedas dos países desenvolvidos.


É consenso que para a obtenção desses objetivos, importantes não apenas para a estabilidade nos países desenvolvidos mas também para impulsionar o crescimento econômico dos países pobres, os EUA reequilibrem sua política fiscal vis-a-vis sua política monetária, reduzindo sua demanda interna e consequentemente seus déficits fiscal e comercial. Por outro lado, caberia aos países mais dinâmicos, como a Alemanha e o Japão, expandir suas economias de forma a manter a meta de um crescimento médio mínimo de 3% ao ano.


O crash de 1987 das principais Bolsas do mundo foi um primeiro alerta para a urgência de medidas corretivas nos EUA. A reação do governo norte-americano no sentido de expandir rapidamente a liquidez da economia - e com isso evitar o erro cometido em 1929, quando houve um movimento inverso que reforçou a recessão - poderá evitar a presença de um desaquecimento ainda mais forte da economia mundial. Por outro lado, esta opção implicará, provavelmente, o abandono do dólar, com todos os inconvenientes que acarretará.


No próximo artigo, serão apontadas as diferenças fundamentais entre o ajustamento dos países altamente endividados e o dos exportadores de manufaturados às novas condições da economia internacional.


 

MARCOS CINTRA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE, 41, é doutor pela Universidade de Harvard (EUA), diretor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas e consultor econômico desta Folha.

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