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  • Marcos Cintra - Folha de S.Paulo

Expectativas otimistas

Com a aproximação de 15 de março, o país vive um momento extremamente interessante. A economia ainda não foi atingida pelo caos característico dos últimos estágios de um processo hiperinflacionário. Isto não afasta aquele risco, pois até mesmo antes da posse ainda estaremos sujeitos àquele perigo. Além disso, qualquer indício de insucesso no plano de estabilização do próximo presidente poderá reverter bruscamente as expectativas, que hoje se mostram bastante otimistas.


A brutal migração de recursos para as cadernetas de poupança reflete não apenas a busca de maior segurança, mas também de rentabilidade mais elevada. Isto confirma as expectativas de bruscas quedas na taxa de inflação após 15 de março. Neste sentido, o próximo presidente não poderá errar, pois qualquer fracasso inicial lhe causará enorme desgaste junto à opinião pública, levando o país para o mesmo trágico caminho da Argentina. Justamente por não poder frustrar a confiança que a população lhe conferiu, o presidente Collor deve optar por uma estratégia antiinflacionária segura. Fala-se que não haverá congelamento de preços e salários. Mas diz-se que haverá um redutor negociado com patrões e empregados, e possivelmente um congelamento nos preços da cesta básica. Ao mesmo tempo, todas as indicações apontam para uma política fiscal rígida, e para reformas institucionais, ou pelo menos comportamentais, que levem a um Banco Central efetivamente preocupado em ser o guardião do valor da moeda nacional.


Percebe-se nesta estratégia a preocupação da equipe econômica no sentido de não tentar mais uma vez fórmulas já desgastadas como o congelamento geral de preços. Mas sente-se também que existe a intenção de provocar uma queda relativamente rápida da inflação, daí o uso de redutores e do congelamento da cesta básica.


Caso se confirmem estas informações, a trajetória inflacionária poderá ser de queda em ritmo acelerado, porém não se pretenderia reduzi-la a zero, como tentado erroneamente no passado.


As chances de sucesso com esta combinação de medidas irão depender fundamentalmente da inflação nas próximas semanas. Caso ela mostre novos sinais de aceleração, esta estratégia poderá esbarrar em enormes dificuldades nas negociações para definir os redutores e também na sustentação do congelamento dos gêneros básicos. Os riscos seriam maiores, e o governo poderia ser forçado a optar por um choque mais ortodoxo, causando pressões contracionistas mais profundas. Além disso, em situação de total descontrole poderia até ser necessário um congelamento geral.


A aceleração da inflação nos últimos meses tornou muito mais difícil a adoção de políticas de renda, com as quais se poderia atenuar os custos econômicos da estabilização. O problema por enquanto é como aplicar um tratamento ortodoxo rigoroso e repartir os custos com equidade.


O novo governo possui a mais importante arma para lograr sucesso: sua credibilidade. Em fases hiperinflacionárias como a que vivemos, trata-se de argumento crucial. A seriedade com que o presidente e sua equipe estão elaborando seus planos, a disciplina e o respeito que o novo mandatário impõe a seus auxiliares e, acima de tudo, a disposição da sociedade em colaborar e aceitar sacrifícios são um alento que reforça a esperança de a economia retomar seu papel de dinamismo, e poder corrigir as distorções e eliminar a miséria que ameaçam inviabilizá-la.


MARCOS CINTRA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE, 43, é doutor pela Universidade de Harvard (EUA), diretor da Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP).

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